quinta-feira, 28 de agosto de 2025

Futebol e Esporte.

 No futebol, craque é um termo para um jogador que se destaca pela alta qualidade técnica e por fazer a diferença em campo, sendo um jogador de grande habilidade e que cumpre bem o seu papel. O termo gênio, por sua vez, é reservado para atletas que estão em um nível ainda superior, exibindo uma criatividade e uma capacidade de antecipação tão notáveis que elevam o esporte à categoria de arte, com movimentos que parecem transcender a própria lógica do jogo. 

Características de um Craque 

Destaque técnico:

Habilidade acima da média e uma qualidade técnica excepcional.

Peça chave do time:

É um jogador que faz a diferença em quase todos os jogos e é fundamental para a equipe.

Desempenho consistente:

Apresenta um desempenho acima da média, mesmo em posições menos favoráveis.

Reconhecimento:

É um jogador que consegue o reconhecimento e o elogio de outros jogadores e do público.

Características de um Gênio

É um jogador que está em um nível de excelência que o distingue ainda mais do craque. 

Possui uma capacidade de criar lances e antecipar jogadas de forma surpreendente, que vai além da competência extrema. 

Os movimentos de um gênio parecem não ser gerados apenas por ele, mas como se viessem de uma fonte de criatividade superior, transformando o esporte em uma experiência mágica e artística. 

Assisti-lo em seu auge pode ser descrito como uma experiência reveladora e de verdadeira epifania, que eleva o status do esporte. 

Exemplos de Gênios e Craques

Gênios:

Em muitos contextos, Pelé, Johan Cruijff, Diego Maradona, Zico, Ronaldo e Ronaldinho Gaúcho são citados como gênios do futebol pela sua capacidade de transcender o esporte. 

Craques:

Jogadores como Romário, Rivaldo, Zidane, Iniesta e Kaká também são considerados craques, reconhecidos por sua grande habilidade e impacto no jogo. 

Os super  génios e génios  genios do esporte caracterizam-se por um conjunto de traços psicológicos como alta motivação, resiliência e capacidade de concentração, aliados a uma inteligência desportiva que lhes permite tomar decisões rápidas e inovadoras. Desenvolvem uma força mental excecional, confiança e um perfeccionismo adaptado para atingir o mais alto nível, controlando o stress e adaptando-se a adversidades. 

Características Psicológicas Comuns

Têm uma forte determinação e mantêm um compromisso contínuo para atingir os seus objetivos. 

Enfrentam os erros e fracassos de forma positiva, buscando soluções em vez de se focarem nos problemas. 

Estabelecem metas elevadas e procuram continuamente melhorar, superando os seus próprios limites. 

Conseguem focar-se no que é importante, mesmo em situações de alta pressão, ignorando distrações. 

Têm a capacidade de controlar o stress e gerir as suas emoções em momentos de competição. 

Demonstram perseverança e a capacidade de manter o alto desempenho sob pressão. 

Possuem a capacidade de analisar situações complexas, encontrar soluções criativas e aprender rapidamente durante as competições. 

Exemplos de Atletas com Essas Características

Pelé (Futebol): 

Embora não seja um "génio do esporte" no sentido de talento nato, Pelé demonstrou grande força mental e controlo emocional, aliando a sua genialidade com uma atitude positiva e acessível. 

LeBron James (Basquetebol):

Conhecido pela sua inteligência desportiva, planeamento e versatilidade mental em campo, é considerado um dos mais inteligentes jogadores da sua modalidade. 

Lionel Messi (Futebol):

A sua criatividade, planeamento estratégico e inteligência cognitiva, como referido no contexto de outros jogadores de elite, são marcas do seu génio. 

Rafa Nadal (Ténis):

Um exemplo de perseverança e mentalidade de combate, com uma força mental incrível que lhe permite recuperar e superar adversidades em jogos. 

Cristiano Ronaldo (Futebol):

A sua disciplina, dedicação e o busca incessante pela superação de recordes demonstram um nível elevado de motivação e perfeccionismo. 

Serena Williams (Ténis):

Um exemplo de resiliência, força mental e adaptabilidade, que a permitiram manter o alto nível durante longos anos de carreira. 


A construção de narrativas de idolatria

 no futebol brasileiro

 Ronaldo Helal

 1. Introdução

 Como tarefa precípua do projeto “Meios de Comunicação, Idolatria e Cul

tura Popular no Brasil”, apoiado pelo CNPq desde 1998, venho estudando

 a forma como são narradas na mídia as trajetórias de vida de ídolos do

 esporte, mais especificamente do futebol.

 As narrativas das trajetórias de vida dos ídolos esportivos freqüentemente fo

calizam características que os transformam em heróis, enquanto as dos ídolos da

 música ou dramaturgia, por exemplo, raramente salientam estas qualidades. A ex

plicação para este fato reside no aspecto agonístico, de luta, que permeia o universo

 do esporte. A competição é inerente ao próprio espetáculo. Ambos, ídolos do espor

te e da música, se transformam em celebridades, porém, os primeiros são mais fa

cilmente considerados “heróis”. Edgar Morin (1980) e Joseph Campbell (1995)

 chamam a atenção para a diferença entre celebridades e heróis. Enquanto os primei

ros vivem para si, os heróis devem agir para “redimir a sociedade”. A saga clássica do

 herói fala de um ser que parte do mundo cotidiano e se aventura a enfrentar obstá

culos considerados intransponíveis, os vence e retorna à casa, trazendo benefícios

 aos seus semelhantes (Campbell, 1995: 36). Esta característica do “ídolo-herói” aca

ba por transformar o universo do esporte em um terreno fértil para a produção de

 mitos e ritos relevantes para a comunidade.

 Meu objetivo neste artigo é apresentar de forma sucinta alguns resultados do

 projeto “Meios de Comunicação, Idolatria e Cultura Popular no Brasil”. Concen

tro-me aqui nas “construções” das narrativas de duas biografias antagônicas de ído

los do futebol brasileiro: Zico e Romário.

 ALCEU - v.4 - n.7 - p. 19 a 36 - jul./dez. 2003

 19

2. Zico: trabalho e disciplina1

 Os êxitos dos ídolos despertam a nossa curiosidade. Suas trajetórias rumo à

 fama são “editadas” na mídia, enfatizando certos aspectos, relegando outros a um

 plano secundário e até mesmo omitindo algumas passagens. No Brasil, as narrativas

 das trajetórias de vida dos ídolos enfatizam sobremaneira a genialidade e o improvi

so como características marcantes e fundamentais para se alcançar o sucesso. Isto se

 torna ainda mais evidente nos universos das artes e dos esportes. A seleção brasileira

 que conquistou o tricampeonato em 1970, por exemplo, é até hoje idealizada como

 uma equipe que não precisava treinar e tampouco necessitava de recomendações

 táticas, quando sabemos que, na verdade, a comissão técnica daquela seleção se uti

lizou de métodos de preparação física dos mais modernos da época2. Já a seleção que

 conquistou o tetracampeonato em 1994 foi criticada por parte considerável da mídia

 justamente por se utilizar de uma “marcação forte” e uma rígida disciplina tática.

 Mesmo vencedora, o trabalho do técnico da seleção até hoje não foi reconhecido,

 como não foram também os trabalhos dos técnicos das outras conquistas até então3

 (Rocha, 1996).

 Qual a relação das idealizações que fazemos do sucesso dos ídolos com os

 “mitos” da cultura? Por que “construímos” narrativas que mitificam o êxito sem a

 ênfase no trabalho e no esforço? Por que frisamos sempre que o aluno que passou

 em primeiro lugar no vestibular levou “uma vida normal, namorando, indo à praia

 ou ao cinema” em vez de dizer que ele estudou 8 horas por dia? Por que falar em

 “esforço” seria um demérito neste país? Não existiriam também outros paradigmas

 de idealização de sucesso? E eles também não seriam vertentes brasileiras, apesar de

 pouco cultuadas? Estas questões vão permear as reflexões nesta parte que se propõe

 a analisar a idealização do sucesso na biografia de Zico.

 Zico foi o maior ídolo do nosso futebol durante as décadas de 70 e 80 e estrela

 de uma geração de jogadores vitoriosos em seus clubes, mas que não lograram êxito

 em Copas do Mundo4. Figura muitas vezes contestada quando saía do universo

 clubístico, sua biografia fala da vitória através do trabalho e de uma sucessão de

 obstáculos e provações que ele teve que superar.

 A análise concentra-se em duas biografias do atleta. Uma, Zico: uma lição de

 vida escrita por Marcus Vinícius de Bucar Nunes e publicada em 1986 pela Offset

 Editora Gráfica e Jornalística, portanto com o jogador ainda em atividade. A outra é

 Zico conta a sua história, escrita por ele mesmo e publicada em 1996 pela FTD, quan

do já era um bem-sucedido empresário do ramo futebolístico.

 Esforço e determinação como elementos fundamentais para se alcançar êxito

 são, muitas vezes, relegados a um plano secundário nos discursos dos cronistas bra

sileiros inseridos nos universos das artes e dos esportes. No caso específico do fute

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bol, chega a ser até uma crítica contundente chamar um jogador de “esforçado”.

 Esta é uma maneira de se dizer que o sujeito não tem talento, porém se esforça. A

 forma oposta seria o talento puro, genuíno, inato, que não precisa de treino ou

 esforço para ser aprimorado, como se não fosse possível ser talentoso e esforçado ao

 mesmo tempo. A biografia de Zico fala de uma realidade calcada primordialmente

 no predomínio do esforço e da determinação como instrumentos basilares para se

 alcançar êxito. É justamente esta faceta que gostaria de chamar a atenção, pois ela

 refuta uma ideologia de sucesso cultuada no imaginário brasileiro.

 Temos na biografia de Zico uma ênfase inicial no passado relativamente po

bre e no prazer e talento inato em jogar futebol que surgiram bem no início da

 infância.

 Nasci numa rua chamada Lucinda Barbosa, em Quintino, um subúrbio do

 Rio de Janeiro (...) Minha mãe tem horror a hospital e por isso deu à luz em

 casa, com a ajuda de uma parteira amiga da gente – bem como Dona Matilde

 queria e como muita gente da vizinhança fazia naquele tempo. Sou o caçula

 de uma família numerosa (Zico, 1996: 7-8)

 Futebol era o que mais me dava prazer na vida. Contam lá em casa que, de

pois de papai e mamãe, a primeira palavra que eu disse foi Dida – meu pri

meiro e até hoje meu maior ídolo no futebol (Zico, 1996: 12).

 Geralmente, as biografias dos ídolos chamam a atenção para a infância pobre

 e o talento como característica inata. Nisto a biografia de Zico não se diferencia das

 dos demais astros do esporte e até mesmo da música e do teatro, por exemplo. Em

 outra ocasião (Coelho e Helal, 1996) verificamos as mesmas características nas bio

grafias do lendário jogador de beisebol Babe Ruth e da cantora Tina Turner. A ênfa

se na boa formação familiar de Zico é, no entanto, bem diferente das narrativas de

 Babe Ruth e Tina Turner, já que ambos tiveram perdas terríveis na infância. O fato

 é que a infância simples ajuda na identificação com o homem comum, e o talento

 inato enquadra-se na ordem das coisas inexplicáveis, fazendo com que os ídolos

 sejam vistos como seres singulares.

 Ao dizer que Dida é “até hoje” seu maior ídolo no futebol, estamos diante do

 Zico reverente, e ordinário. É o extraordinário, juntando-se ao ordinário, ao “ho

mem comum” que tem seus ídolos e os reverencia. De fato, os ídolos têm que

 conviver constantemente com o drama de ser dois: o homem e o mito. Como no

 futebol é comum o jogador possuir um apelido (pelo qual é conhecido e famoso)

 podemos dizer, por exemplo, que por detrás dos “homens” Edson, Diego e Arthur,

 surgiram os “super-homens” Pelé, Maradona e Zico. Notemos que esta

 “esquizofrenia” inerente ao ídolo ou essa divisão em duas personas, uma “público

mítica”, outra “privada-humana”, pode aparecer explicitamente nos discursos de

 21

alguns deles como Pelé, por exemplo, que sempre frisou a diferença entre “Pelé” e

 o “Edson”.

 A partir deste processo, comum em quase toda a narrativa da figura do herói,

 a biografia de Zico passa a privilegiar o esforço e o trabalho como determinantes

 para se atingir o sucesso. É o próprio Zico quem diz no prefácio do livro de Bucar

 Nunes, Zico: uma lição de vida:

 Sempre entendi, desde menino, que ninguém será capaz de exercer bem a

 sua profissão, sem se exercitar bastante e sempre, para o exercício dela. Afi

nal, não aprendemos que o maior merecimento dos vitoriosos é confiar, apai

xonadamente, na eficácia do trabalho? Acho que isto deveria ser, sempre, o

 objetivo maior de cada um de nós: lutar por aquilo que se gosta (...) Mas, sem

 dúvida, muita luta, muito trabalho, muito suor existem no caminho da deter

minação de cada um.

 Este é um discurso mais próximo da ética puritana das sociedades anglo

saxônicas, afastando-se do modelo “Malasartes” e “Macunaíma” que parte da mídia

 tende a cultuar no Brasil, especialmente no domínio do futebol. O estudo sobre a

 construção da figura de Romário, como veremos adiante, nos revela uma biografia

 muito mais próxima do modelo “Malasartes” e “Macunaíma”, exaustivamente ana

lisado por Roberto Da Matta (1979) que, inclusive, traz para o discurso acadêmico

 a narrativa do “malandro” como uma vertente tipicamente brasileira, corroboran

do, assim, a postura adotada por parte da mídia.5

 A ascensão de Zico foi bastante gradual com muitos obstáculos no caminho,

 a começar pelo seu corpo franzino que quase o impediu de, aos treze anos de idade,

 fazer um teste no Flamengo. Por isso, logo após se firmar na escolinha, ele se sub

meteu a um árduo tratamento para reforçar a musculatura e que o levou a renunciar

 a vários prazeres próprios da adolescência. Este período de sua vida ganha uma di

mensão singular em sua biografia. Mais do que dificuldades financeiras, comum

 nas histórias de vida dos astros do nosso futebol e que ajudam no processo de iden

tificação com os fãs, esta passagem na vida de Zico fala de determinação, esforço e

 renúncia dando início a uma trajetória repleta de obstáculos rumo ao posto de estre

la maior do futebol brasileiro.

 O despertador tocava no horário habitual: 5h30m da manhã. Com a roupa do

 Colégio e devidamente alimentado com um café da manhã reforçado, partia

 para o ponto de ônibus ou para a estação de Quintino. A primeira parada de

 ônibus ou do trem era a Central do Brasil. Daí à Gávea (...). Chegava cerca de

 meia hora antes do treino, que iniciava às 9 horas. Mais ou menos às 11 horas

 estava deixando o campo número dois do Flamengo. Um banho rápido, al

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moço lá mesmo na cantina da Gávea, e pé na estrada, rumo à cidade, porque

 às 12h30m as aulas estavam começando (...) Às 5 da tarde, no final da aula,

 tinha que tomar outra condução. O destino era, novamente a Zona Sul da

 cidade onde, na Academia Paula Ribeiro, treinava firme até às 8 horas da noi

te. No retorno para Quintino, aí pelas 9 da noite, mesmo passando pela Cen

tral do Brasil para a tradicional “conexão”, o trânsito, facilitado pelo horário,

 era mais rápido: por volta das 10h30m da noite estava chegando em casa.

 Banho, um capricho na última alimentação do dia, e pumba... APAGAVA

 (Bucar Nunes, 1986: 38).

 Bucar Nunes afirma ainda que ele “tinha orgulho do seu autocontrole, da sua

 determinação, em busca do seu objetivo” (Bucar Nunes, 1986: 32). E o próprio

 Zico ao se lembrar daquela rotina faz a seguinte reflexão: “Anos depois, quando

 sofri aquela contusão no joelho, alguém iria me dizer que na vida a gente precisa de

 duas coisas: paciência e memória; e precisa de memória principalmente para lem

brar que precisa ter paciência” (Zico,1996: 26).

 Este tratamento a que se submeteu ainda bem jovem fez com que Zico ficas

se conhecido no início da carreira como “craque de laboratório”. Ou seja, de um

 planejamento “científico”, com a ajuda de médicos, nutricionistas e modernas téc

nicas e aparelhos de educação física, surgiu uma grande estrela do futebol. Era o

 racional, o objetivo e o matemático unindo-se ao lúdico, ao talento e à improvisa

ção. É interessante notar, no entanto, que apesar das biografias enfatizarem positiva

mente a dedicação de Zico a este trabalho “científico”, à época a alcunha “craque de

 laboratório” era utilizada, muitas vezes, de forma pejorativa, significando um cra

que não genuíno, fugindo das características “artísticas”, “espontâneas” e “criativas”

 do nosso futebol6.

 O que se evidencia é que o mito Zico surge ancorado primordialmente em

 características de sua personalidade. Brandão (1993: 23) fala de “honorabilidade

 pessoal”, “excelência” e “superioridade em relação aos outros mortais” como virtu

des inerentes à condição do herói. A “superioridade” de Zico encontra-se mais na

 forma com que enfrenta os desafios e os obstáculos que a vida impõe do que em seu

 talento extraordinário para o futebol. Neste sentido, a narrativa em torno de Zico

 enquadra-se no rol dos arquétipos universais dos heróis. Ela nos mostra que não

 basta o ato heróico em si, de forma isolada – no caso, as vitórias, as realizações e os

 gols no futebol. O herói tem que preencher outros requisitos – tais como perseve

rança, determinação, luta, honestidade, altruísmo – para se firmar no posto7. E Zico

 os preenche com bastante eficácia.

 As biografias de Zico destacam os constantes desafios que ele superou com

 “armas” da sua personalidade para lograr êxito. Campbell (1990: 133-134) explica

 que as “provações são concebidas para ver se o pretendente a herói pode realmente

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ser um herói. Será que ele está à altura da tarefa? Será que é capaz de ultrapassar os

 perigos? Será que tem a coragem, o conhecimento, a capacidade que o habilitem a

 servir?” As provações na carreira de Zico começaram bem cedo. Depois do proble

ma do corpo franzino, Zico sofreu uma grande decepção ao não ser convocado para

 as Olimpíadas de 1972. Seguindo o conselho do próprio técnico da Seleção Olímpi

ca, Zico, que em 1971 já começara a jogar entre os profissionais, voltou para os

 juvenis a fim de ser convocado para as Olimpíadas que se realizariam no ano se

guinte. A convocação não veio e ele, a princípio, reagiu de forma “ordinária”, com

 sentimento de revolta, decepção e muito abatimento: “alguma coisa, uma espécie

 de confiança nos outros, na justiça do mundo, tinha se desfeito. A seleção havia se

 classificado para os Jogos Olímpicos com um gol meu, eu confiara na promessa de

 convocação. Fiquei muito abatido e só pensava em largar o futebol” (Zico, 1996: 33

34). No entanto, esta “derrota” contribuiu ainda mais para sua obstinação: “a pri

meira semana de treino foi melancólica. Dura de chegar ao fim. Mas já na semana

 seguinte, ao lembrar da não convocação, treinava com mais garra ainda, transfor

mando toda a sua revolta íntima em energia positiva para treinar” (Bucar Nunes,

 1986: 52).

 Ainda assim, mesmo com toda esta dedicação e cada vez mais aprimorando a

 sua técnica, Zico levou um tempo para ser firmar na equipe profissional do Flamengo.

 Os técnicos temiam pelo seu corpo ainda franzino e ele passou o ano de 1973 no

 banco de reservas do time principal sendo escalado em diversas posições durante as

 partidas. Contudo, até deste fato Zico tirou algo de positivo enfatizando que apren

deu a jogar em todas as posições do ataque, o que o tornou ainda mais versátil e

 completo para o futebol moderno (Bucar Nunes, 1986: 61 e Zico, 1996: 36).

 A oportunidade para vir a ser titular da equipe veio em 1974, quando o técni

co dos juvenis – que tinha sido campeão com Zico e que, portanto, conhecia todo o

 seu potencial – assumiu o comando do time profissional. Mais uma vez, uma sur

presa: início do primeiro treino com o novo técnico no comando e Zico estava

 escalado na reserva. No entanto, este fato serviu para despertar definitivamente o

 espírito guerreiro e desenvolver o senso de profissionalismo: “agora a vontade mai

or era mostrar, imediatamente, a si próprio, que não iria faltar garra para dar a volta

 por cima mais uma vez. Com satisfação ou não, era profissional e estava ali para

 treinar” (Bucar Nunes, 1986: 63). O resultado foi que marcou dois “gols belíssimos”

 e os reservas venceram por 3 a 1 (Bucar Nunes, 1986: 64). Estava conquistada, de

 forma sofrida, a posição de titular. Deste momento em diante, Zico mitifica a cami

sa 10 do Flamengo, conhece a fama e transforma-se em um grande ídolo. Tudo isso,

 porém, em um caminho cheio de obstáculos e provações. Conforme ele mesmo

 diz:

 24

Por toda a minha carreira, enfrentei diversas tentativas de desacreditar meu

 futebol. Já disseram que eu só era bom jogador no Maracanã, que não sabia

 jogar na seleção, que não suportava marcação à européia, e mais dezenas de

 acusações às quais respondia jogando (Zico, 1996: 45).

 Aprendi com meu pai a respeitar meu trabalho e a valorizar o que consigo

 com meu esforço. Todo dia tínhamos que treinar finalizações e passes. São

 nossos instrumentos de trabalho (...) Eu me habituei a ser o jogador mais

 cobrado. Estava em evidência o tempo todo, era minha responsabilidade, in

clusive, dar o exemplo de dedicação e profissionalismo, não faltar aos treinos

 sem motivo justo, não perder vôos nem horários (...) Eu queria fazer carreira,

 queria ser o melhor, ou pelo menos estar entre os melhores. Então, isso tinha

 um preço, havia responsabilidades incluídas nesse objetivo (Zico, 1996: 56

57).

 Referindo-se a um episódio ocorrido na vida de Zico em 1979, Bucar Nunes

 destaca de forma emblemática:

 E foi com absoluta convicção que ele pôde comprovar, mais uma vez, que o

 TRABALHO com DETERMINAÇÃO é o capital que menos falha (...) Os

 comentários, apesar do sucesso do Flamengo e dos gols fora de série, que

 surgiam a cada partida, eram maldosos. Principalmente em relação aos jogos

 internacionais (...) Estava mostrando ao mundo que tinha condições de estar

 entre os melhores porque tinha trabalhado com afinco, desde criança, para

 vencer na sua profissão (Bucar Nunes, 1986: 110-114). (Os destaques são do

 autor)

 O que se verifica na biografia de Zico é a construção de uma narrativa na qual

 uma série de obstáculos, perdas e fracassos são sempre acompanhados de uma his

tória de muito trabalho, determinação e profissionalismo: “nada acontece por acaso

 e para todas as coisas há um preço. Em qualquer atividade, treinamento e persistên

cia são fundamentais” (Zico, 1996: 125). Dentro da explicação de Umberto Eco

 (1979) sobre o fascínio que o mito do super-homem exerce sobre nós, podemos

 dizer que do Zico “humano” – e as perdas das Copas do Mundo contribuíram para

 dar um tom ainda mais “humano” à sua biografia – surge um ser “extraordinário”

 que através de muito treino, trabalho e esforço superou obstáculos e atingiu a gló

ria.

 Assim, a biografia de Zico ao enfatizar, de forma peremptória, o sucesso atra

vés do esforço e do trabalho, junta-se aos modelos de heróis mais próximos das

 sociedades anglo-saxônicas, permeadas por uma ética única do trabalho e do indiví

duo. Este modelo é antagônico ao padrão predominante na construção da idolatria

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nas narrativas, por assim dizer, “oficiais” – nas quais a mídia é o instrumento

 legitimador – no Brasil. Aqui, temos freqüentemente um ideal “essencializado” de

 seres “moleques” e “irreverentes”. Chamo a atenção para o fato de que a biografia

 de Zico, mesmo contrariando este padrão “oficial”, também é uma vertente brasi

leira. Mesmo que a maioria dos modelos de idolatria em nossa sociedade enfatize

 um padrão mais próximo do que “essencializamos” como sendo tipicamente brasi

leiro, há espaço para outras narrativas mais universalistas, mas que nem por isso

 deixam de ser também brasileiras.

 3. Romário: malandragem e irreverência8

 Nesta parte, investigo a forma como vem sendo construída na mídia a figura

 de Romário. O material analisado concentra-se em dois períodos emblemáticos da

 trajetória do atleta rumo ao posto de herói da seleção brasileira: a) partida entre

 Brasil e Uruguai nas eliminatórias para a Copa de 1994 (uma semana antes da par

tida e uma semana após); e b) Copa do Mundo de 1994 (uma semana antes do início

 da Copa até duas semanas após a conquista)9. A escolha destes períodos para a aná

lise que se segue deve-se ao fato deles marcarem peremptoriamente o lugar de

 Romário no rol dos heróis do futebol brasileiro.

 De certa forma, as narrativas das trajetórias de vida dos ídolos rumo à fama e

 ao estrelato apresentam características semelhantes. Campbell (1995:15), por exem

plo, afirma que “é sempre com a mesma história – que muda de forma e não obstante

 é prodigiosamente constante – que nos deparamos”. No entanto, apesar das seme

lhanças, algumas diferenças são observadas e, por isso mesmo, merecem ser subli

nhadas.

 Na análise da biografia de Zico ficou evidente tratar-se de um modelo mais

 próximo do herói clássico. Estávamos diante de uma narrativa que enfatiza a supe

ração constante de vários obstáculos e a vitória conquistada primordialmente com

 muito trabalho e disciplina. No entanto, ali mesmo alertávamos para o fato desta

 biografia ser antagônica ao modelo de herói mais predominante no Brasil. O dife

rencial nas narrativas brasileiras centra-se justamente na ênfase da conquista através

 da “genialidade”, “irreverência” ou “malandragem”. E os recursos acionados pela

 mídia na construção da figura de Romário enfatizam estes atributos “essencializados”

 como “tipicamente brasileiros”.

 Notemos ainda que a trajetória de Romário rumo ao estrelato coincide justa

mente com o encerramento da carreira de Zico, em fevereiro de 1990. Apesar de

 polêmico e de ter suas atitudes criticadas por muitos, Romário foi, durante a década

 de 90, o atleta de futebol mais festejado pela mídia e torcida brasileira. A consagra

ção maior de Romário veio com a conquista da Copa do Mundo de 1994 e a trajetó

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ria do jogador neste período é rica em elementos que servem como chave para uma

 compreensão do fenômeno da idolatria na cultura brasileira.

 Nas eliminatórias para a Copa do Mundo de 1994, chegou um momento em

 que a seleção brasileira precisava vencer a do Uruguai para garantir sua vaga. Romário,

 que tinha sido afastado da seleção em dezembro de 1992, por ter se recusado a ficar

 na reserva em uma partida amistosa contra a Alemanha, é convocado pelo então

 técnico Parreira para a partida decisiva. Na época, havia dúvidas entre os integrantes

 da comissão técnica com relação à convocação do atacante, por conta de problemas

 disciplinares. No entanto, sob forte pressão da mídia e de torcedores e devido aos

 resultados pouco convincentes da seleção, Parreira decide convocá-lo para a partida

 contra o Uruguai.

 Romário retorna, desta feita, com a missão de salvar a seleção de uma possí

vel eliminação. Monta-se, assim, o palco para uma trajetória pontuada por lances

 que nos remetem, por um lado, à saga clássica do herói e, por outro, ao “tipo ideal”10

 de herói brasileiro.

 A manchete da seção de esportes de O Globo de 8 de setembro de 1993

 estampava: “Os uruguaios que se cuidem”. Era uma alusão à chegada de Romário e

 o texto desta matéria enfatizava o retorno do “verdadeiro futebol brasileiro” à sele

ção. Em um box no canto da página temos uma reportagem com o título “Um cra

que indisciplinado desde as seleções amadoras” em que são lembrados, em ordem

 cronológica, vários atos de irresponsabilidade e indisciplina do jogador. No entan

to, a matéria ameniza os atos ressaltando os gols do atleta. Ou seja, temos aqui o

 exemplo do “desempenho” como categoria que possibilita a redenção do atleta. Na

 página seguinte, uma entrevista com o jogador que diz em um determinado mo

mento: “sei que sou bom e estou em boa fase (...) Eu sempre soube fazer gols e isso

 é o que todo mundo quer. Em 13 jogos no Barcelona já fiz 17 gols. Na Holanda, em

 142 jogos fiz 148 gols. Por isso eles gostam de mim”. Este excesso de confiança e

 individualismo que costuma ser interpretado como arrogância e egoísmo, é ameni

zado em uma nota que destaca os atos altruístas de Romário, como por exemplo, a

 preocupação de ajudar parentes e amigos.

 Curioso notar que esta “sinceridade” em se achar bom não é uma atitude

 muito comum no Brasil. Roberto Da Matta (1977), por exemplo, já tinha sublinha

do o fato de que, diferente da sociedade americana, dificilmente um brasileiro se diz

 bom em alguma coisa. A falsa modéstia é uma vertente muito mais recorrente em

 nossa cultura. Romário consegue com esta faceta de sua personalidade confundir e

 até mesmo polemizar com aqueles que o idolatram11.

 Desde sua chegada, o noticiário esportivo produziu um número expressivo

 de matérias sobre seu passado e sua “missão redentora”. A ênfase freqüentemente

 recaía na “malandragem” unida à competência do atleta em fazer gols. No dia 12 de

 setembro de 1993, O Globo estampava na página de esportes “O pequeno e travesso

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Romário”. No texto da matéria, uma menção do pai de Romário reforça o estereó

tipo de “marrento” como algo nato, que já nasceu com o jogador: “já era um baixi

nho invocado – lembra seu Edevair”. “Marrento” e “invocado” falam de uma carac

terística de se envolver em brigas, confusões, ter um temperamento “tinhoso”, “di

fícil”. Na mesma edição, temos um box com o sugestivo título “Brigas, nunca mais”,

 em que Romário se diz amadurecido e ter aprendido muito com as “confusões” que

 se envolveu ao longo de sua carreira.

 Os recursos acionados pela mídia nesta construção vão formando um perso

nagem singular, “irreverente”, de “temperamento difícil”, mas amadurecido, sa

bendo dosar o lado “marrento”. Ou seja, sabendo ser “malandro”, não confrontan

do-se mais de frente com as forças do sistema, mas caminhando na fronteira entre a

 ordem e a desordem12.

 De forma emblemática a matéria com a manchete “Um príncipe do futebol

moleque” (O Globo, 13/09/1993) inicia da seguinte forma:

 Irresponsável. Irreverente. Irrequieto. Egoísta. Debochado. Abusado. Explo

sivo. Quase uma bomba que tem pernas. Autoritário. Radical. Parece o dono

 do mundo. Talentoso. Rápido. Craque. Artilheiro. Faz gol como quem brin

ca. Baixinho. Pernas arcadas. Língua presa. Biotipo plebeu para um príncipe

 do futebol-moleque: Romário.

 As primeiras características apontadas no texto nos remetem a uma persona

lidade negativa, de certa forma repudiada pela sociedade. No entanto, logo a seguir

 surgem as características positivas de “brasilidade”: artilheiro, craque, “faz gol como

 quem brinca”, reforçando assim o lado “lúdico”, “alegre”, “criança” e “ingênuo” de

 Romário. E mais adiante, como que para amenizar os atributos negativos apontados

 no início do texto temos o seguinte:

 Mas há nele um lado altruísta. Desde a típica primeira atitude do generoso

 garoto pobre que sobressai no futebol – adquirir uma casa para a família – até

 a defesa de companheiros que mal conhece, como um episódio em que com

prou a briga do então pouco famoso Lira com o técnico Lazaroni, no Vasco,

 em 1987.

 O altruísmo se confronta assim com o egoísmo e o individualismo, compon

do um personagem dúbio, mas que, no entanto, torna-se coerente com a destreza e

 habilidade do jogador em superar dificuldades no campo de jogo. Apesar da ênfase

 do tipo “sou bom” ou “sou o melhor”, repetida por Romário em diversas entrevis

tas, as conquistas no terreno futebolístico, ainda mais em uma Copa do Mundo, são

 28

compartilhadas com os torcedores. Ou seja, independente das ações altruísticas de

 Romário fora de campo, vez por outra noticiada na mídia, suas conquistas, em ter

mos de seleção, serão sempre as de todos os brasileiros.

 Notemos também que o elemento de “picardia” é louvado como o retorno

 do que convencionamos chamar no Brasil de “futebol-arte”. Esta é uma discussão

 que começou na Copa de 1958, quando a seleção brasileira enfrentou o chamado

 “futebol-científico” da então União Soviética. De lá para cá, a dimensão dada a esta

 oposição tornou-se singular para se entender o fenômeno futebolístico no país e sua

 correlação com a cultura. Atentemos para o fato de que quando estamos diante de

 campeonatos locais e nacionais, a discussão entre “arte” e “força”, torna-se secundá

ria e a ênfase no discurso da vitória recai sobre elementos tais como “união”, “con

junto” e “determinação”. Ocorre que a seleção brasileira tem o poder de se transfor

mar em metáfora da nação, na “pátria de chuteiras”, como muito bem alcunhou o

 dramaturgo e escritor Nelson Rodrigues décadas atrás13. Aqui, principalmente em

 Copas do Mundo, tendemos a valorizar o lado mais estético, alegre, criativo, e “ar

tístico” do futebol, como sendo características típicas da sociedade brasileira.

 Assim, no dia 15 de setembro daquele ano, a matéria com o título “Irreverência

 e habilidade na Granja. É Romário” apresenta, logo de início, o sugestivo texto: “o

 mesmo jeito relaxado, de pouco empenho e até uma certa má vontade no aqueci

mento. Na hora da bola rolar, malícia, habilidade e competência”. Malícia e habili

dade se sobrepondo ao treino e à preparação física. Como a seleção não vinha apre

sentando um futebol considerado “arte” pela mídia – em várias reportagens anteri

ores comentava-se que estava faltando “alegria”, “picardia”, enfim “malandragem”

 na seleção – o retorno de Romário tornava a seleção mais “brasileira”. Ou seja,

 Romário aparece como o elemento capaz de nos fazer reconhecer no futebol da

 seleção.

 No primeiro treino para a partida decisiva, o noticiário ressalta o entrosamento

 da dupla Romário-Bebeto, mas sempre enfatizando o lado “malandro” do primeiro.

 Em outra matéria publicada no mesmo 15 de setembro, sob o título “Dez para a

 dupla diabólica” temos o seguinte destaque: “Romário, com jeito moleque, disse

 que nem sabia quantos gols tinha feito (marcou três...)”. Em um box com o título

 “Romário, um craque até na arte de provocar risos”  temos a seguinte declaração do

 atleta: “antes eu era o problemático, o polêmico... salvador da pátria, vai ser mole

 para mim” e ainda falando sobre o adversário: “não sei o nome de nenhum zaguei

ro, nem quero saber. Para mim, com líbero ou cinco laterais é a mesma coisa. O

 único que me chateia é o goleiro, que tira os gols da gente”.

 A ciência que Romário tem de seu papel assemelha-se ao início da saga clás

sica do herói que atende ao chamado e parte em busca da missão redentora (Campbell,

 1995 e Brandão, 1993). Porém, Romário age com uma boa dose de picardia ao tratar

 da missão como algo fácil e encarar os adversários com ar de deboche, nos fazendo

 29

lembrar de Garrincha, “a alegria do povo”, o herói brasileiro cuja biografia

 antagonizava com a de Pelé na década de 196014.

 Veio a partida contra o Uruguai e Romário, autor dos dois gols da vitória por

 2 a 0, “veste” a capa do “herói”, do “redentor”, do “salvador”, daquele que “ouviu o

 chamado, partiu para a missão e saiu-se bem sucedido, dividindo o feito com seus

 semelhantes” (Campbell, 1995).

 No dia seguinte à partida a manchete da edição de esportes de O Globo es

tampava “O show de Romário” com o seguinte texto:

 O futebol agradece a Romário. Os torcedores santificam Romário. Zagalo

 aplaude Romário. Bebeto quase chora ao lado de Romário. O mundo se ren

de a Romário. Não é exagero... O pequeno atacante do Barcelona cumpriu

 tudo o que prometera durante a semana. Fez os dois gols da vitória por 2 a 0

 sobre o Uruguai (...) e deu autêntico show, ontem no Maracanã, para delírio

 de mais de cem mil torcedores (...)Romário é craque. Romário é arte. Romário

 é gol (...) O indisciplinado, rebelde, irreverente, o atrevido baixinho nascido

 no Jacarezinho e criado na Vila da Penha provou que sua arte dentro do cam

po compensa seus eternos problemas e até a má vontade para treinar (O Glo

bo, 20/09/93).

 A promessa tinha sido cumprida, o Brasil vencera o Uruguai com dois gols

 de Romário e estava classificado para a Copa do Mundo de 1994. A narrativa enfatiza

 a conquista com “show” e “arte”, atributos que redimem Romário das “indisciplinas”,

 do “atrevimento” e da “má vontade para treinar”. Contribuindo para a construção

 da narrativa mítica, o texto diz que “o mundo se rende a Romário”, ressaltando no

 final tratar-se de um “atrevido baixinho nascido no Jacarezinho e criado na Vila da

 Penha”. A ênfase na origem pobre é uma constante em quase todas as narrativas das

 biografias de nossos heróis futebolísticos. Não que esta origem não corresponda à

 realidade. Certamente ela é verdadeira. Estou chamando a atenção para a dimensão

 dada a ela. E, neste sentido, a narrativa mítica em torno da biografia de Romário

 assemelha-se a de quase todos outros heróis do nosso futebol.

 Porém, a construção da biografia de Romário é também pontuada por passa

gens que “glamourizam” a malandragem, a irreverência, o deboche e o relaxamento

 (não gostar de treinar). É como se estivéssemos diante da vitória construída somen

te com talento e arte, como se trabalho, concentração, determinação e esforço fos

sem elementos dispensáveis para o êxito. E é neste sentido que a biografia de Romário

 antagoniza com a de Zico.

 Durante a Copa do Mundo de 1994, a pressão sobre Romário vai ganhando

 um novo contorno: o atleta deveria, além de ganhar a Copa, fazer a seleção jogar o

 “verdadeiro futebol brasileiro”. Descontentes com o esquema tático utilizado pelotécnico da seleção, jornalistas e colunistas não poupavam críticas à forma de se apre

sentar da seleção. Romário passa a ser visto como o jogador capaz de resgatar a

 “brasilidade” na seleção. Além disso, Romário, volta e meia, desafiava a comissão

 técnica dando declarações de insatisfação com as apresentações da seleção. Ele pas

sou, assim, a ter voz e um espaço considerável na mídia15.

 Uma semana antes da estréia contra a Rússia, o noticiário se voltava para

 Romário dividindo-se em relatos de seu temperamento rebelde e de sua consciên

cia da missão que lhe era atribuída: ganhar a Copa16. A rebeldia é tratada de forma

 positiva como, por exemplo, na matéria “A dura missão de Dunga: domar o

 irreverente Romário” (O Globo, 16/06/94). Aqui, o texto destaca declarações de

 Dunga de que Romário está amadurecido, mais consciente de seu papel na seleção.

 Interessante notar que é justamente Dunga, o emblema do jogador limitado tecni

camente, mas que se “esforça” o tempo todo e cumpre à risca as determinações

 táticas, quem tem autoridade para falar de Romário. O jogador que tinha sido mar

cado negativamente na Copa de 1990 – “Era Dunga”17 – como o exemplo do futebol

 que o Brasil deveria execrar, surge como o atleta que tem a missão de “domar o

 irreverente Romário”. Dunga está para a “ordem”, assim como Romário está para a

 “desordem”. Ou seja, temos aqui de forma paradigmática a convivência da “ordem”

 com a “desordem”. E mais ainda a evidência do freqüente processo de redenção que

 o universo esportivo nos oferece18, já que Dunga teria a oportunidade de se redimir

 da fama que lhe impuseram na Copa anterior.

 Após a vitória na estréia contra a Rússia por 2 a 0, a manchete da seção de

 esportes de O Globo dizia “Vila da Penha 2 x 0 Kremlin” com o seguinte texto: o

 Kremlin se rendeu à Vila da Penha do baixinho invocado: a estréia da seleção, uma

 maiúscula vitória por 2 a 0 sobre a Rússia, foi o jogo de Romário”. Mais uma vez, a

 mídia recorre a elementos ligados à origem pobre.. A ciência da missão de ganhar a

 Copa é enfatizada em “O gênio da área – Romário diz que apenas começou a jogar”

 (O Globo 22/06/94) com a seguinte declaração: “o gol na estréia foi só o começo. Já

 disse que esta Copa é minha”19.

 A partir daí o que temos é uma sucessão de declarações de Romário dizendo

 que “vai ganhar a Copa para o Brasil”,20 e manchetes e textos que enfatizam sobre

maneira a “brasilidade” de seu futebol  Partida após partida, estas matérias vão se

 repetindo e terminam por “construir” um personagem heróico, com os atributos

 daquilo que “essencializamos” como sendo “tipicamente brasileiro”. Assim, em

 “Romário, o nome do tetra verde e amarelo” (O Globo, 18/07/93) temos o seguinte:

 O tetracampeonato tem nome, sobrenome e origem: Romário de Souza Fa

ria, de 28 anos, nascido no Jacarezinho e criado na Vila da Penha. Por isso

 mesmo, o tetra não poderia ser mais brasileiro, mais verde e amarelo. A traje

tória de Romário é a cara do futebol do país. Dos campinhos de terra batida

 31

de um subúrbio do Rio até o Maracanã, a Europa, os EUA... o mundo. Ver

 Romário campeão é acreditar que o Brasil do jeito que a gente conhece pode

 ser mais. Pode ser campeão mundial (...) A fala cheia de gírias, os dribles que

 derrubam a lenda de que no futebol moderno não há lugar para a habilidade– dribles de uma petulância só admissível nos campinhos da Vila da Penha.

 Romário é assim. Já disse que, para ele, qualquer jogo é uma pelada em seu

 subúrbio. O que faz lembrar um atacante de pernas tortas, campeão do mun

do, que chamava todos os laterais de João (...).

 Fecha-se, assim, um círculo iniciado com a convocação de Romário para a

 partida contra o Uruguai pelas eliminatórias da Copa do Mundo. O “indisciplinado”

 Romário, através do excepcional talento, venceu a “disciplina” – “os dribles derru

bando a lenda de que no futebol moderno não há lugar para a habilidade”. A origem

 humilde somada à “fala cheia de gírias” conferem o caráter de brasilidade ao herói.

 Na edição “midiatizada” evidencia-se ainda um discurso do futebol como metáfora

 da nação bem como da junção do indivíduo com o coletivo: “ver Romário campeão

 é acreditar que o Brasil do jeito que a gente conhece pode ser mais. Pode ser cam

peão mundial”. A vitória de Romário é a de todos nós e a referência à Garrincha ao

 final do texto, contribui ainda mais para conferirmos características de “brasilidade”– bem ao estilo Macunaíma – do novo herói.

  Na edição da biografia de Romário como o herói da conquista da Copa do

 Mundo de 1994, os recursos acionados pela mídia construíram um personagem

 singular na nossa cultura. Quando falamos de Romário, apesar de dividir mais opi

niões do que Zico,21estamos lidando com as “essencializações” que fazemos de nós

 mesmos, como seres mais “irresponsáveis”, “irreverentes” e “indisciplinados”, com

 tudo de bom e de ruim que estes atributos carregam. A biografia de Romário lida

 com aspectos mais impregnados em nosso imaginário, não ficando restritos à sua

 biografia. Os atributos ressaltados na sua biografia são os mesmos que destacamos

 na representação que fazemos de nós diante de um estrangeiro22.

 Tanto a narrativa da biografia de Zico quanto a de Romário, seja na imprensa

 ou nos livros, contêm informações “verdadeiras”. Porém, trata-se, em ambos os

 casos, de uma edição dos fatos e, neste sentido, certos aspectos são super

 dimensionados enquanto outros são relegados a um plano secundário. A eficácia da

 edição ancora-se, no entanto, nos discursos e ações dos próprios atletas em questão.

 E como ambos são consumidores da mídia e enquanto sujeitos psicológicos incor

poram as “realidades” ali “construídas”, eles passam a agir e a fazer declarações

 inseridas no contexto criado que, por sua vez, tem que estar relacionado a um con

texto existente na sociedade. Assim, as narrativas das trajetórias míticas em torno

 das figuras de Zico e Romário falam de dois modelos antagônicos de heróis e nos

 mostram que as construções de suas biografias fazem parte de uma relação dialética

 32

e dinâmica entre as ações dos “objetos mitificados” – Zico e Romário – e o contexto

 social – o Flamengo das décadas de setenta e oitenta e a seleção brasileira na Copa do

 Mundo de 1994.

 Ronaldo Helal

 Professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro

 Notas

 1. Uma versão ampliada da análise da biografia do Zico encontra-se em “As

 idealizações do sucesso no imaginário brasileiro”. In:  Logos n° 10, Faculdade de

 Comunicação Social, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, 1999.

 Posteriormente foi publicada, com algumas modificações, em “As idealizações de

 sucesso no imaginário futebolístico brasileiro: um estudo de caso”. In: Alabarces,

 Pablo (org.) - Peligro de Gol: estudios sobre deporte y sociedad en America Latina - Buenos

 Aires, CLACSO, 2000. E mais adiante em “As idealizações do sucesso no imaginário

 brasileiro”. In: Helal, R.; Soares, A J. e Lovisolo, H. (orgs.) A invenção do país do

 futebol: mídia, raça e idolatria. Rio de Janeiro: Mauad, 2001.

 2. Isto pode ser comprovado nas matérias jornalísticas da época. Interessante notar

 a reconstrução da memória da Copa de 1970 nos jornais de hoje.

 3. O enaltecimento da mídia ao técnico Luis Felipe Scolari na conquista da Copa do

 Mundo de 2002 é uma exceção nas narrativas das cinco Copas conquistadas pelo

 Brasil

 4. Algumas das observações aqui apresentadas foram extraídas também, com algumas

 alterações, do artigo “Mídia, ídolos e heróis do futebol” publicado na revista

 Comunicação, Movimento e Mídia na Educação Física, vol.2 , ano 2, CEFD/UFSM, 1999.

 5. Sobre uma discussão a respeito da reprodução de narrativas da imprensa pela

 academia ver Soares (1998) e Helal e Gordon (1998).

 6. Esta observação está calcada em depoimentos tomados pelo autor de pessoas ligadas

 ao universo do futebol.

 7. Para uma análise sobre o modelo universal da figura do herói tendo como fonte

 de análise o filme Herói por acidente de Stephen Frears, ver Helal in Rocha (1998).

 8. Uma versão ampliada da análise da biografia de Romário encontra-se em “Idolatria

 e malandragem: a cultura brasileira na biografia de Romário” trabalho apresentado

 na 11ª COMPÓS, UFRJ, 2002 (Publicação em CD-ROM).

 9. Sou grato aqui ao meu ex-bolsista de iniciação científica da Uerj, Gerardo Catunda

 Martins Júnior, pela coleta do material impresso. A coleta foi feita sobre as matérias

 publicadas na seção de esportes do jornal O Globo.

 10. No sentido weberiano da expressão, reunindo os traços dominantes, as

 características mais significativas de um sistema, uma “construção abstrata que o

 pesquisador faz no processo de apreensão de um fenômeno social, a partir de sua

 diversidade no real” (Soares, 1994).  11. Em entrevistas informais com alunos da Faculdade de Comunicação da Uerj

 que o têm como ídolo, todos amenizavam esta “sinceridade” ou “arrogância” com

 um “no fundo ele não é nada disso” ou  “ele é muito simples e incompreendido”.

 12. Mais uma vez, ver Da Matta(1979) e Soares (1994).

 13. Apesar de que a metáfora vem perdendo força nas últimas décadas, como César

 Gordon e eu mostramos em outras ocasiões. Ver por exemplo “A crise do futebol

 brasileiro e a pós-modernidade: perspectivas para o século XXI”. In: Eco-Pós Vol. 5,

 n. 1 – Publicação da Pós-Graduação em Comunicação e Cultura,  Rio de Janeiro:

 UFRJ, 2002;  “The Crisis of Brazilian Football: perspectives for the twenty-first

 century”. In: J. A. Mangan e COSTA, Lamartine (orgs.) Sport in Latin American Society:

 past and present. Essex: Frank Cass Publishers, 2002; “Futebol - mitos e representações

 do Brasil”. In: Villaça, Nízia e Goés, Fred (orgs.) Nas Fronteiras do Contemporâneo:

 território, identidade, arte, moda, corpo e mídia. Rio de Janeiro: Mauad, 2001.

 14. Não estou com isso dizendo que a biografia de Garrincha fez mais sucesso do

 que a de Pelé. Apenas enfatizo a “glamourização” de uma biografia malandra em

 contraponto a uma outra mais ordeira, mas não necessariamente “caxias”.

 15. Interessante notar que a rebeldia mais ao estilo “Macunaíma”, hedonista, “não

 gostar de treinar”, ser “preguiçoso”, vai dando lugar a uma rebeldia mais “politizada”,

 “denunciadora”. Para uma discussão mais detalhada desta transformação da rebeldia

 “Macunaíma” para uma “politizada”, ver Guedes (1995).

 16. Ver por exemplo a matéria “Romário: sou um vencedor. Vou arrebentar nesta

 Copa” (O Globo, 16/06/94)

 17. Esta expressão foi alcunhada pelo técnico da seleção brasileira de 1990, Sebastião

 Lazaroni, para exprimir o estilo de jogo que pretendia adotar na Copa do Mundo.

 Com a derrota do Brasil para a Argentina, a mídia “decretou” em diversas reportagens

 o fim da “Era Dunga”.

 18. Ver Helal (2000).

 19. Uma outra afirmação de Romário destacou-se no noticiário do dia 21 de junho

 de 1994: “foi uma estréia na Copa. Mas encaro todos os jogos como se fossem uma

 pelada” (O Globo, 21/06/94). Esta afirmação e o destaque dado a ela, lembrou, uma

 vez mais, Garrincha na Copa de 1958 onde ele teria dito que chamava todos os

 marcadores de “João”.

 20. Ver por exemplo “Romário - Fico mais à vontade na hora de decidir” (O Globo,

 13/07/94)

 21. Percepções do autor baseadas no acompanhamento diário do noticiário esportivo

 no país.

 22. O mais curioso é que Romário contribui ainda mais para o antagonismo das

 duas biografias ao declarar que “Zico nunca foi nada na seleção” (O Globo, 13/07/

 94). Esta e outras declarações de Romário em relação à Zico, aparecem ao longo da

 década de 1990, culminando com o corte do jogador da seleção em 1998. Mais

 curioso ainda foi o fato de Romário, após a Copa de 1994, ter jogado no Flamengo

 por quase 5 anos, clube que tem Zico como seu maior ídolo.

 34

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 ZICO. Zico conta sua história. São Paulo: FTD, 1996.

 Resumo

 Apresentando resultados parciais do projeto “Meios de Comunicação, Idolatria e Cultura

 Popular no Brasil”, apoiado pelo CNPq, o artigo se propõe a analisar duas biografias de

 ídolos do futebol brasileiro: Zico e Romário. O artigo conclui que a biografia de Zico, ao

 enfatizar o sucesso através do esforço e do trabalho, junta-se ao modelo de herói clássico.

 Este modelo é antagônico ao padrão predominante na construção da idolatria nas narrativas

 “oficiais” no Brasil. Aqui, temos freqüentemente um ideal “essencializado” de seres

 “moleques” e “irreverentes”. Já a análise da biografia de Romário, tendo como base

 principalmente o material jornalístico sobre sua trajetória na conquista da Copa do Mundo

 de 1994, demonstra como os recursos acionados pela mídia dimensionam aspectos

 relacionados à “irreverência” e à “malandragem”, construindo um personagem singular da

 nossa cultura. As narrativas das trajetórias dos dois atletas falam de modelos antagônicos de

 heróis cultuados em nossa cultura e nos mostram que as construções de suas biografia fazem

 parte de uma relação dialética entre as ações dos “objetos mitificados” – Zico e Romário – e

 o contexto social.

 Palavras-chave

 Esporte, mídia, idolatria.

 Abstract

 This article presents partial results of the Project “Media, Idolatry and Popular Culture in

 Brazil”, granted by CNPq. It analyses two biographies of idols of Brazilian soccer: Zico and

 Romário. The article concludes that Zico’s biography emphasizes success throughout

 discipline and work, configuring the pattern of the classic hero. The opposite pattern

 predominates in the construction of idolatry in the “official” narratives in Brazil. Here we

 have very often an “essencialized” ideal of “irreverent” and “undisciplined” human beings.

 However, the analysis of Romário’s biography, mostly based on the press coverage about his

 performance during the victory of 1994 Soccer World Cup, shows that the media’s narrative

 emphasizes qualities related to “irreverence” and “roguery”, constructing a singular character

 of our culture. The narratives of the trajectory of both athletes concern about antagonist

 hero patterns of Brazilian culture and show us that the “construction” of their biographies

 is part of a dialectical relation between the acts of the “mythical objects” - Zico and Romário– and the social context.

 Key-words

 Sport, Media, Idolatry

Confira os gols oficiais .        .       https://docs.ufpr.br/~mmsabino/sstatistics/gol_oficial.html

Imagem ; Facbook Fábio Azevedo.

 


 



 





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