No futebol, craque é um termo para um jogador que se destaca pela alta qualidade técnica e por fazer a diferença em campo, sendo um jogador de grande habilidade e que cumpre bem o seu papel. O termo gênio, por sua vez, é reservado para atletas que estão em um nível ainda superior, exibindo uma criatividade e uma capacidade de antecipação tão notáveis que elevam o esporte à categoria de arte, com movimentos que parecem transcender a própria lógica do jogo.
Características de um Craque
Destaque técnico:
Habilidade acima da média e uma qualidade técnica excepcional.
Peça chave do time:
É um jogador que faz a diferença em quase todos os jogos e é fundamental para a equipe.
Desempenho consistente:
Apresenta um desempenho acima da média, mesmo em posições menos favoráveis.
Reconhecimento:
É um jogador que consegue o reconhecimento e o elogio de outros jogadores e do público.
Características de um Gênio
É um jogador que está em um nível de excelência que o distingue ainda mais do craque.
Possui uma capacidade de criar lances e antecipar jogadas de forma surpreendente, que vai além da competência extrema.
Os movimentos de um gênio parecem não ser gerados apenas por ele, mas como se viessem de uma fonte de criatividade superior, transformando o esporte em uma experiência mágica e artística.
Assisti-lo em seu auge pode ser descrito como uma experiência reveladora e de verdadeira epifania, que eleva o status do esporte.
Exemplos de Gênios e Craques
Gênios:
Em muitos contextos, Pelé, Johan Cruijff, Diego Maradona, Zico, Ronaldo e Ronaldinho Gaúcho são citados como gênios do futebol pela sua capacidade de transcender o esporte.
Craques:
Jogadores como Romário, Rivaldo, Zidane, Iniesta e Kaká também são considerados craques, reconhecidos por sua grande habilidade e impacto no jogo.
Os super génios e génios genios do esporte caracterizam-se por um conjunto de traços psicológicos como alta motivação, resiliência e capacidade de concentração, aliados a uma inteligência desportiva que lhes permite tomar decisões rápidas e inovadoras. Desenvolvem uma força mental excecional, confiança e um perfeccionismo adaptado para atingir o mais alto nível, controlando o stress e adaptando-se a adversidades.
Características Psicológicas Comuns
Têm uma forte determinação e mantêm um compromisso contínuo para atingir os seus objetivos.
Enfrentam os erros e fracassos de forma positiva, buscando soluções em vez de se focarem nos problemas.
Estabelecem metas elevadas e procuram continuamente melhorar, superando os seus próprios limites.
Conseguem focar-se no que é importante, mesmo em situações de alta pressão, ignorando distrações.
Têm a capacidade de controlar o stress e gerir as suas emoções em momentos de competição.
Demonstram perseverança e a capacidade de manter o alto desempenho sob pressão.
Possuem a capacidade de analisar situações complexas, encontrar soluções criativas e aprender rapidamente durante as competições.
Exemplos de Atletas com Essas Características
Pelé (Futebol):
Embora não seja um "génio do esporte" no sentido de talento nato, Pelé demonstrou grande força mental e controlo emocional, aliando a sua genialidade com uma atitude positiva e acessível.
LeBron James (Basquetebol):
Conhecido pela sua inteligência desportiva, planeamento e versatilidade mental em campo, é considerado um dos mais inteligentes jogadores da sua modalidade.
Lionel Messi (Futebol):
A sua criatividade, planeamento estratégico e inteligência cognitiva, como referido no contexto de outros jogadores de elite, são marcas do seu génio.
Rafa Nadal (Ténis):
Um exemplo de perseverança e mentalidade de combate, com uma força mental incrível que lhe permite recuperar e superar adversidades em jogos.
Cristiano Ronaldo (Futebol):
A sua disciplina, dedicação e o busca incessante pela superação de recordes demonstram um nível elevado de motivação e perfeccionismo.
Serena Williams (Ténis):
Um exemplo de resiliência, força mental e adaptabilidade, que a permitiram manter o alto nível durante longos anos de carreira.
A construção de narrativas de idolatria
no futebol brasileiro
Ronaldo Helal
1. Introdução
Como tarefa precípua do projeto “Meios de Comunicação, Idolatria e Cul
tura Popular no Brasil”, apoiado pelo CNPq desde 1998, venho estudando
a forma como são narradas na mídia as trajetórias de vida de ídolos do
esporte, mais especificamente do futebol.
As narrativas das trajetórias de vida dos ídolos esportivos freqüentemente fo
calizam características que os transformam em heróis, enquanto as dos ídolos da
música ou dramaturgia, por exemplo, raramente salientam estas qualidades. A ex
plicação para este fato reside no aspecto agonístico, de luta, que permeia o universo
do esporte. A competição é inerente ao próprio espetáculo. Ambos, ídolos do espor
te e da música, se transformam em celebridades, porém, os primeiros são mais fa
cilmente considerados “heróis”. Edgar Morin (1980) e Joseph Campbell (1995)
chamam a atenção para a diferença entre celebridades e heróis. Enquanto os primei
ros vivem para si, os heróis devem agir para “redimir a sociedade”. A saga clássica do
herói fala de um ser que parte do mundo cotidiano e se aventura a enfrentar obstá
culos considerados intransponíveis, os vence e retorna à casa, trazendo benefícios
aos seus semelhantes (Campbell, 1995: 36). Esta característica do “ídolo-herói” aca
ba por transformar o universo do esporte em um terreno fértil para a produção de
mitos e ritos relevantes para a comunidade.
Meu objetivo neste artigo é apresentar de forma sucinta alguns resultados do
projeto “Meios de Comunicação, Idolatria e Cultura Popular no Brasil”. Concen
tro-me aqui nas “construções” das narrativas de duas biografias antagônicas de ído
los do futebol brasileiro: Zico e Romário.
ALCEU - v.4 - n.7 - p. 19 a 36 - jul./dez. 2003
19
2. Zico: trabalho e disciplina1
Os êxitos dos ídolos despertam a nossa curiosidade. Suas trajetórias rumo à
fama são “editadas” na mídia, enfatizando certos aspectos, relegando outros a um
plano secundário e até mesmo omitindo algumas passagens. No Brasil, as narrativas
das trajetórias de vida dos ídolos enfatizam sobremaneira a genialidade e o improvi
so como características marcantes e fundamentais para se alcançar o sucesso. Isto se
torna ainda mais evidente nos universos das artes e dos esportes. A seleção brasileira
que conquistou o tricampeonato em 1970, por exemplo, é até hoje idealizada como
uma equipe que não precisava treinar e tampouco necessitava de recomendações
táticas, quando sabemos que, na verdade, a comissão técnica daquela seleção se uti
lizou de métodos de preparação física dos mais modernos da época2. Já a seleção que
conquistou o tetracampeonato em 1994 foi criticada por parte considerável da mídia
justamente por se utilizar de uma “marcação forte” e uma rígida disciplina tática.
Mesmo vencedora, o trabalho do técnico da seleção até hoje não foi reconhecido,
como não foram também os trabalhos dos técnicos das outras conquistas até então3
(Rocha, 1996).
Qual a relação das idealizações que fazemos do sucesso dos ídolos com os
“mitos” da cultura? Por que “construímos” narrativas que mitificam o êxito sem a
ênfase no trabalho e no esforço? Por que frisamos sempre que o aluno que passou
em primeiro lugar no vestibular levou “uma vida normal, namorando, indo à praia
ou ao cinema” em vez de dizer que ele estudou 8 horas por dia? Por que falar em
“esforço” seria um demérito neste país? Não existiriam também outros paradigmas
de idealização de sucesso? E eles também não seriam vertentes brasileiras, apesar de
pouco cultuadas? Estas questões vão permear as reflexões nesta parte que se propõe
a analisar a idealização do sucesso na biografia de Zico.
Zico foi o maior ídolo do nosso futebol durante as décadas de 70 e 80 e estrela
de uma geração de jogadores vitoriosos em seus clubes, mas que não lograram êxito
em Copas do Mundo4. Figura muitas vezes contestada quando saía do universo
clubístico, sua biografia fala da vitória através do trabalho e de uma sucessão de
obstáculos e provações que ele teve que superar.
A análise concentra-se em duas biografias do atleta. Uma, Zico: uma lição de
vida escrita por Marcus Vinícius de Bucar Nunes e publicada em 1986 pela Offset
Editora Gráfica e Jornalística, portanto com o jogador ainda em atividade. A outra é
Zico conta a sua história, escrita por ele mesmo e publicada em 1996 pela FTD, quan
do já era um bem-sucedido empresário do ramo futebolístico.
Esforço e determinação como elementos fundamentais para se alcançar êxito
são, muitas vezes, relegados a um plano secundário nos discursos dos cronistas bra
sileiros inseridos nos universos das artes e dos esportes. No caso específico do fute
20
bol, chega a ser até uma crítica contundente chamar um jogador de “esforçado”.
Esta é uma maneira de se dizer que o sujeito não tem talento, porém se esforça. A
forma oposta seria o talento puro, genuíno, inato, que não precisa de treino ou
esforço para ser aprimorado, como se não fosse possível ser talentoso e esforçado ao
mesmo tempo. A biografia de Zico fala de uma realidade calcada primordialmente
no predomínio do esforço e da determinação como instrumentos basilares para se
alcançar êxito. É justamente esta faceta que gostaria de chamar a atenção, pois ela
refuta uma ideologia de sucesso cultuada no imaginário brasileiro.
Temos na biografia de Zico uma ênfase inicial no passado relativamente po
bre e no prazer e talento inato em jogar futebol que surgiram bem no início da
infância.
Nasci numa rua chamada Lucinda Barbosa, em Quintino, um subúrbio do
Rio de Janeiro (...) Minha mãe tem horror a hospital e por isso deu à luz em
casa, com a ajuda de uma parteira amiga da gente – bem como Dona Matilde
queria e como muita gente da vizinhança fazia naquele tempo. Sou o caçula
de uma família numerosa (Zico, 1996: 7-8)
Futebol era o que mais me dava prazer na vida. Contam lá em casa que, de
pois de papai e mamãe, a primeira palavra que eu disse foi Dida – meu pri
meiro e até hoje meu maior ídolo no futebol (Zico, 1996: 12).
Geralmente, as biografias dos ídolos chamam a atenção para a infância pobre
e o talento como característica inata. Nisto a biografia de Zico não se diferencia das
dos demais astros do esporte e até mesmo da música e do teatro, por exemplo. Em
outra ocasião (Coelho e Helal, 1996) verificamos as mesmas características nas bio
grafias do lendário jogador de beisebol Babe Ruth e da cantora Tina Turner. A ênfa
se na boa formação familiar de Zico é, no entanto, bem diferente das narrativas de
Babe Ruth e Tina Turner, já que ambos tiveram perdas terríveis na infância. O fato
é que a infância simples ajuda na identificação com o homem comum, e o talento
inato enquadra-se na ordem das coisas inexplicáveis, fazendo com que os ídolos
sejam vistos como seres singulares.
Ao dizer que Dida é “até hoje” seu maior ídolo no futebol, estamos diante do
Zico reverente, e ordinário. É o extraordinário, juntando-se ao ordinário, ao “ho
mem comum” que tem seus ídolos e os reverencia. De fato, os ídolos têm que
conviver constantemente com o drama de ser dois: o homem e o mito. Como no
futebol é comum o jogador possuir um apelido (pelo qual é conhecido e famoso)
podemos dizer, por exemplo, que por detrás dos “homens” Edson, Diego e Arthur,
surgiram os “super-homens” Pelé, Maradona e Zico. Notemos que esta
“esquizofrenia” inerente ao ídolo ou essa divisão em duas personas, uma “público
mítica”, outra “privada-humana”, pode aparecer explicitamente nos discursos de
21
alguns deles como Pelé, por exemplo, que sempre frisou a diferença entre “Pelé” e
o “Edson”.
A partir deste processo, comum em quase toda a narrativa da figura do herói,
a biografia de Zico passa a privilegiar o esforço e o trabalho como determinantes
para se atingir o sucesso. É o próprio Zico quem diz no prefácio do livro de Bucar
Nunes, Zico: uma lição de vida:
Sempre entendi, desde menino, que ninguém será capaz de exercer bem a
sua profissão, sem se exercitar bastante e sempre, para o exercício dela. Afi
nal, não aprendemos que o maior merecimento dos vitoriosos é confiar, apai
xonadamente, na eficácia do trabalho? Acho que isto deveria ser, sempre, o
objetivo maior de cada um de nós: lutar por aquilo que se gosta (...) Mas, sem
dúvida, muita luta, muito trabalho, muito suor existem no caminho da deter
minação de cada um.
Este é um discurso mais próximo da ética puritana das sociedades anglo
saxônicas, afastando-se do modelo “Malasartes” e “Macunaíma” que parte da mídia
tende a cultuar no Brasil, especialmente no domínio do futebol. O estudo sobre a
construção da figura de Romário, como veremos adiante, nos revela uma biografia
muito mais próxima do modelo “Malasartes” e “Macunaíma”, exaustivamente ana
lisado por Roberto Da Matta (1979) que, inclusive, traz para o discurso acadêmico
a narrativa do “malandro” como uma vertente tipicamente brasileira, corroboran
do, assim, a postura adotada por parte da mídia.5
A ascensão de Zico foi bastante gradual com muitos obstáculos no caminho,
a começar pelo seu corpo franzino que quase o impediu de, aos treze anos de idade,
fazer um teste no Flamengo. Por isso, logo após se firmar na escolinha, ele se sub
meteu a um árduo tratamento para reforçar a musculatura e que o levou a renunciar
a vários prazeres próprios da adolescência. Este período de sua vida ganha uma di
mensão singular em sua biografia. Mais do que dificuldades financeiras, comum
nas histórias de vida dos astros do nosso futebol e que ajudam no processo de iden
tificação com os fãs, esta passagem na vida de Zico fala de determinação, esforço e
renúncia dando início a uma trajetória repleta de obstáculos rumo ao posto de estre
la maior do futebol brasileiro.
O despertador tocava no horário habitual: 5h30m da manhã. Com a roupa do
Colégio e devidamente alimentado com um café da manhã reforçado, partia
para o ponto de ônibus ou para a estação de Quintino. A primeira parada de
ônibus ou do trem era a Central do Brasil. Daí à Gávea (...). Chegava cerca de
meia hora antes do treino, que iniciava às 9 horas. Mais ou menos às 11 horas
estava deixando o campo número dois do Flamengo. Um banho rápido, al
22
moço lá mesmo na cantina da Gávea, e pé na estrada, rumo à cidade, porque
às 12h30m as aulas estavam começando (...) Às 5 da tarde, no final da aula,
tinha que tomar outra condução. O destino era, novamente a Zona Sul da
cidade onde, na Academia Paula Ribeiro, treinava firme até às 8 horas da noi
te. No retorno para Quintino, aí pelas 9 da noite, mesmo passando pela Cen
tral do Brasil para a tradicional “conexão”, o trânsito, facilitado pelo horário,
era mais rápido: por volta das 10h30m da noite estava chegando em casa.
Banho, um capricho na última alimentação do dia, e pumba... APAGAVA
(Bucar Nunes, 1986: 38).
Bucar Nunes afirma ainda que ele “tinha orgulho do seu autocontrole, da sua
determinação, em busca do seu objetivo” (Bucar Nunes, 1986: 32). E o próprio
Zico ao se lembrar daquela rotina faz a seguinte reflexão: “Anos depois, quando
sofri aquela contusão no joelho, alguém iria me dizer que na vida a gente precisa de
duas coisas: paciência e memória; e precisa de memória principalmente para lem
brar que precisa ter paciência” (Zico,1996: 26).
Este tratamento a que se submeteu ainda bem jovem fez com que Zico ficas
se conhecido no início da carreira como “craque de laboratório”. Ou seja, de um
planejamento “científico”, com a ajuda de médicos, nutricionistas e modernas téc
nicas e aparelhos de educação física, surgiu uma grande estrela do futebol. Era o
racional, o objetivo e o matemático unindo-se ao lúdico, ao talento e à improvisa
ção. É interessante notar, no entanto, que apesar das biografias enfatizarem positiva
mente a dedicação de Zico a este trabalho “científico”, à época a alcunha “craque de
laboratório” era utilizada, muitas vezes, de forma pejorativa, significando um cra
que não genuíno, fugindo das características “artísticas”, “espontâneas” e “criativas”
do nosso futebol6.
O que se evidencia é que o mito Zico surge ancorado primordialmente em
características de sua personalidade. Brandão (1993: 23) fala de “honorabilidade
pessoal”, “excelência” e “superioridade em relação aos outros mortais” como virtu
des inerentes à condição do herói. A “superioridade” de Zico encontra-se mais na
forma com que enfrenta os desafios e os obstáculos que a vida impõe do que em seu
talento extraordinário para o futebol. Neste sentido, a narrativa em torno de Zico
enquadra-se no rol dos arquétipos universais dos heróis. Ela nos mostra que não
basta o ato heróico em si, de forma isolada – no caso, as vitórias, as realizações e os
gols no futebol. O herói tem que preencher outros requisitos – tais como perseve
rança, determinação, luta, honestidade, altruísmo – para se firmar no posto7. E Zico
os preenche com bastante eficácia.
As biografias de Zico destacam os constantes desafios que ele superou com
“armas” da sua personalidade para lograr êxito. Campbell (1990: 133-134) explica
que as “provações são concebidas para ver se o pretendente a herói pode realmente
23
ser um herói. Será que ele está à altura da tarefa? Será que é capaz de ultrapassar os
perigos? Será que tem a coragem, o conhecimento, a capacidade que o habilitem a
servir?” As provações na carreira de Zico começaram bem cedo. Depois do proble
ma do corpo franzino, Zico sofreu uma grande decepção ao não ser convocado para
as Olimpíadas de 1972. Seguindo o conselho do próprio técnico da Seleção Olímpi
ca, Zico, que em 1971 já começara a jogar entre os profissionais, voltou para os
juvenis a fim de ser convocado para as Olimpíadas que se realizariam no ano se
guinte. A convocação não veio e ele, a princípio, reagiu de forma “ordinária”, com
sentimento de revolta, decepção e muito abatimento: “alguma coisa, uma espécie
de confiança nos outros, na justiça do mundo, tinha se desfeito. A seleção havia se
classificado para os Jogos Olímpicos com um gol meu, eu confiara na promessa de
convocação. Fiquei muito abatido e só pensava em largar o futebol” (Zico, 1996: 33
34). No entanto, esta “derrota” contribuiu ainda mais para sua obstinação: “a pri
meira semana de treino foi melancólica. Dura de chegar ao fim. Mas já na semana
seguinte, ao lembrar da não convocação, treinava com mais garra ainda, transfor
mando toda a sua revolta íntima em energia positiva para treinar” (Bucar Nunes,
1986: 52).
Ainda assim, mesmo com toda esta dedicação e cada vez mais aprimorando a
sua técnica, Zico levou um tempo para ser firmar na equipe profissional do Flamengo.
Os técnicos temiam pelo seu corpo ainda franzino e ele passou o ano de 1973 no
banco de reservas do time principal sendo escalado em diversas posições durante as
partidas. Contudo, até deste fato Zico tirou algo de positivo enfatizando que apren
deu a jogar em todas as posições do ataque, o que o tornou ainda mais versátil e
completo para o futebol moderno (Bucar Nunes, 1986: 61 e Zico, 1996: 36).
A oportunidade para vir a ser titular da equipe veio em 1974, quando o técni
co dos juvenis – que tinha sido campeão com Zico e que, portanto, conhecia todo o
seu potencial – assumiu o comando do time profissional. Mais uma vez, uma sur
presa: início do primeiro treino com o novo técnico no comando e Zico estava
escalado na reserva. No entanto, este fato serviu para despertar definitivamente o
espírito guerreiro e desenvolver o senso de profissionalismo: “agora a vontade mai
or era mostrar, imediatamente, a si próprio, que não iria faltar garra para dar a volta
por cima mais uma vez. Com satisfação ou não, era profissional e estava ali para
treinar” (Bucar Nunes, 1986: 63). O resultado foi que marcou dois “gols belíssimos”
e os reservas venceram por 3 a 1 (Bucar Nunes, 1986: 64). Estava conquistada, de
forma sofrida, a posição de titular. Deste momento em diante, Zico mitifica a cami
sa 10 do Flamengo, conhece a fama e transforma-se em um grande ídolo. Tudo isso,
porém, em um caminho cheio de obstáculos e provações. Conforme ele mesmo
diz:
24
Por toda a minha carreira, enfrentei diversas tentativas de desacreditar meu
futebol. Já disseram que eu só era bom jogador no Maracanã, que não sabia
jogar na seleção, que não suportava marcação à européia, e mais dezenas de
acusações às quais respondia jogando (Zico, 1996: 45).
Aprendi com meu pai a respeitar meu trabalho e a valorizar o que consigo
com meu esforço. Todo dia tínhamos que treinar finalizações e passes. São
nossos instrumentos de trabalho (...) Eu me habituei a ser o jogador mais
cobrado. Estava em evidência o tempo todo, era minha responsabilidade, in
clusive, dar o exemplo de dedicação e profissionalismo, não faltar aos treinos
sem motivo justo, não perder vôos nem horários (...) Eu queria fazer carreira,
queria ser o melhor, ou pelo menos estar entre os melhores. Então, isso tinha
um preço, havia responsabilidades incluídas nesse objetivo (Zico, 1996: 56
57).
Referindo-se a um episódio ocorrido na vida de Zico em 1979, Bucar Nunes
destaca de forma emblemática:
E foi com absoluta convicção que ele pôde comprovar, mais uma vez, que o
TRABALHO com DETERMINAÇÃO é o capital que menos falha (...) Os
comentários, apesar do sucesso do Flamengo e dos gols fora de série, que
surgiam a cada partida, eram maldosos. Principalmente em relação aos jogos
internacionais (...) Estava mostrando ao mundo que tinha condições de estar
entre os melhores porque tinha trabalhado com afinco, desde criança, para
vencer na sua profissão (Bucar Nunes, 1986: 110-114). (Os destaques são do
autor)
O que se verifica na biografia de Zico é a construção de uma narrativa na qual
uma série de obstáculos, perdas e fracassos são sempre acompanhados de uma his
tória de muito trabalho, determinação e profissionalismo: “nada acontece por acaso
e para todas as coisas há um preço. Em qualquer atividade, treinamento e persistên
cia são fundamentais” (Zico, 1996: 125). Dentro da explicação de Umberto Eco
(1979) sobre o fascínio que o mito do super-homem exerce sobre nós, podemos
dizer que do Zico “humano” – e as perdas das Copas do Mundo contribuíram para
dar um tom ainda mais “humano” à sua biografia – surge um ser “extraordinário”
que através de muito treino, trabalho e esforço superou obstáculos e atingiu a gló
ria.
Assim, a biografia de Zico ao enfatizar, de forma peremptória, o sucesso atra
vés do esforço e do trabalho, junta-se aos modelos de heróis mais próximos das
sociedades anglo-saxônicas, permeadas por uma ética única do trabalho e do indiví
duo. Este modelo é antagônico ao padrão predominante na construção da idolatria
25
nas narrativas, por assim dizer, “oficiais” – nas quais a mídia é o instrumento
legitimador – no Brasil. Aqui, temos freqüentemente um ideal “essencializado” de
seres “moleques” e “irreverentes”. Chamo a atenção para o fato de que a biografia
de Zico, mesmo contrariando este padrão “oficial”, também é uma vertente brasi
leira. Mesmo que a maioria dos modelos de idolatria em nossa sociedade enfatize
um padrão mais próximo do que “essencializamos” como sendo tipicamente brasi
leiro, há espaço para outras narrativas mais universalistas, mas que nem por isso
deixam de ser também brasileiras.
3. Romário: malandragem e irreverência8
Nesta parte, investigo a forma como vem sendo construída na mídia a figura
de Romário. O material analisado concentra-se em dois períodos emblemáticos da
trajetória do atleta rumo ao posto de herói da seleção brasileira: a) partida entre
Brasil e Uruguai nas eliminatórias para a Copa de 1994 (uma semana antes da par
tida e uma semana após); e b) Copa do Mundo de 1994 (uma semana antes do início
da Copa até duas semanas após a conquista)9. A escolha destes períodos para a aná
lise que se segue deve-se ao fato deles marcarem peremptoriamente o lugar de
Romário no rol dos heróis do futebol brasileiro.
De certa forma, as narrativas das trajetórias de vida dos ídolos rumo à fama e
ao estrelato apresentam características semelhantes. Campbell (1995:15), por exem
plo, afirma que “é sempre com a mesma história – que muda de forma e não obstante
é prodigiosamente constante – que nos deparamos”. No entanto, apesar das seme
lhanças, algumas diferenças são observadas e, por isso mesmo, merecem ser subli
nhadas.
Na análise da biografia de Zico ficou evidente tratar-se de um modelo mais
próximo do herói clássico. Estávamos diante de uma narrativa que enfatiza a supe
ração constante de vários obstáculos e a vitória conquistada primordialmente com
muito trabalho e disciplina. No entanto, ali mesmo alertávamos para o fato desta
biografia ser antagônica ao modelo de herói mais predominante no Brasil. O dife
rencial nas narrativas brasileiras centra-se justamente na ênfase da conquista através
da “genialidade”, “irreverência” ou “malandragem”. E os recursos acionados pela
mídia na construção da figura de Romário enfatizam estes atributos “essencializados”
como “tipicamente brasileiros”.
Notemos ainda que a trajetória de Romário rumo ao estrelato coincide justa
mente com o encerramento da carreira de Zico, em fevereiro de 1990. Apesar de
polêmico e de ter suas atitudes criticadas por muitos, Romário foi, durante a década
de 90, o atleta de futebol mais festejado pela mídia e torcida brasileira. A consagra
ção maior de Romário veio com a conquista da Copa do Mundo de 1994 e a trajetó
26
ria do jogador neste período é rica em elementos que servem como chave para uma
compreensão do fenômeno da idolatria na cultura brasileira.
Nas eliminatórias para a Copa do Mundo de 1994, chegou um momento em
que a seleção brasileira precisava vencer a do Uruguai para garantir sua vaga. Romário,
que tinha sido afastado da seleção em dezembro de 1992, por ter se recusado a ficar
na reserva em uma partida amistosa contra a Alemanha, é convocado pelo então
técnico Parreira para a partida decisiva. Na época, havia dúvidas entre os integrantes
da comissão técnica com relação à convocação do atacante, por conta de problemas
disciplinares. No entanto, sob forte pressão da mídia e de torcedores e devido aos
resultados pouco convincentes da seleção, Parreira decide convocá-lo para a partida
contra o Uruguai.
Romário retorna, desta feita, com a missão de salvar a seleção de uma possí
vel eliminação. Monta-se, assim, o palco para uma trajetória pontuada por lances
que nos remetem, por um lado, à saga clássica do herói e, por outro, ao “tipo ideal”10
de herói brasileiro.
A manchete da seção de esportes de O Globo de 8 de setembro de 1993
estampava: “Os uruguaios que se cuidem”. Era uma alusão à chegada de Romário e
o texto desta matéria enfatizava o retorno do “verdadeiro futebol brasileiro” à sele
ção. Em um box no canto da página temos uma reportagem com o título “Um cra
que indisciplinado desde as seleções amadoras” em que são lembrados, em ordem
cronológica, vários atos de irresponsabilidade e indisciplina do jogador. No entan
to, a matéria ameniza os atos ressaltando os gols do atleta. Ou seja, temos aqui o
exemplo do “desempenho” como categoria que possibilita a redenção do atleta. Na
página seguinte, uma entrevista com o jogador que diz em um determinado mo
mento: “sei que sou bom e estou em boa fase (...) Eu sempre soube fazer gols e isso
é o que todo mundo quer. Em 13 jogos no Barcelona já fiz 17 gols. Na Holanda, em
142 jogos fiz 148 gols. Por isso eles gostam de mim”. Este excesso de confiança e
individualismo que costuma ser interpretado como arrogância e egoísmo, é ameni
zado em uma nota que destaca os atos altruístas de Romário, como por exemplo, a
preocupação de ajudar parentes e amigos.
Curioso notar que esta “sinceridade” em se achar bom não é uma atitude
muito comum no Brasil. Roberto Da Matta (1977), por exemplo, já tinha sublinha
do o fato de que, diferente da sociedade americana, dificilmente um brasileiro se diz
bom em alguma coisa. A falsa modéstia é uma vertente muito mais recorrente em
nossa cultura. Romário consegue com esta faceta de sua personalidade confundir e
até mesmo polemizar com aqueles que o idolatram11.
Desde sua chegada, o noticiário esportivo produziu um número expressivo
de matérias sobre seu passado e sua “missão redentora”. A ênfase freqüentemente
recaía na “malandragem” unida à competência do atleta em fazer gols. No dia 12 de
setembro de 1993, O Globo estampava na página de esportes “O pequeno e travesso
27
Romário”. No texto da matéria, uma menção do pai de Romário reforça o estereó
tipo de “marrento” como algo nato, que já nasceu com o jogador: “já era um baixi
nho invocado – lembra seu Edevair”. “Marrento” e “invocado” falam de uma carac
terística de se envolver em brigas, confusões, ter um temperamento “tinhoso”, “di
fícil”. Na mesma edição, temos um box com o sugestivo título “Brigas, nunca mais”,
em que Romário se diz amadurecido e ter aprendido muito com as “confusões” que
se envolveu ao longo de sua carreira.
Os recursos acionados pela mídia nesta construção vão formando um perso
nagem singular, “irreverente”, de “temperamento difícil”, mas amadurecido, sa
bendo dosar o lado “marrento”. Ou seja, sabendo ser “malandro”, não confrontan
do-se mais de frente com as forças do sistema, mas caminhando na fronteira entre a
ordem e a desordem12.
De forma emblemática a matéria com a manchete “Um príncipe do futebol
moleque” (O Globo, 13/09/1993) inicia da seguinte forma:
Irresponsável. Irreverente. Irrequieto. Egoísta. Debochado. Abusado. Explo
sivo. Quase uma bomba que tem pernas. Autoritário. Radical. Parece o dono
do mundo. Talentoso. Rápido. Craque. Artilheiro. Faz gol como quem brin
ca. Baixinho. Pernas arcadas. Língua presa. Biotipo plebeu para um príncipe
do futebol-moleque: Romário.
As primeiras características apontadas no texto nos remetem a uma persona
lidade negativa, de certa forma repudiada pela sociedade. No entanto, logo a seguir
surgem as características positivas de “brasilidade”: artilheiro, craque, “faz gol como
quem brinca”, reforçando assim o lado “lúdico”, “alegre”, “criança” e “ingênuo” de
Romário. E mais adiante, como que para amenizar os atributos negativos apontados
no início do texto temos o seguinte:
Mas há nele um lado altruísta. Desde a típica primeira atitude do generoso
garoto pobre que sobressai no futebol – adquirir uma casa para a família – até
a defesa de companheiros que mal conhece, como um episódio em que com
prou a briga do então pouco famoso Lira com o técnico Lazaroni, no Vasco,
em 1987.
O altruísmo se confronta assim com o egoísmo e o individualismo, compon
do um personagem dúbio, mas que, no entanto, torna-se coerente com a destreza e
habilidade do jogador em superar dificuldades no campo de jogo. Apesar da ênfase
do tipo “sou bom” ou “sou o melhor”, repetida por Romário em diversas entrevis
tas, as conquistas no terreno futebolístico, ainda mais em uma Copa do Mundo, são
28
compartilhadas com os torcedores. Ou seja, independente das ações altruísticas de
Romário fora de campo, vez por outra noticiada na mídia, suas conquistas, em ter
mos de seleção, serão sempre as de todos os brasileiros.
Notemos também que o elemento de “picardia” é louvado como o retorno
do que convencionamos chamar no Brasil de “futebol-arte”. Esta é uma discussão
que começou na Copa de 1958, quando a seleção brasileira enfrentou o chamado
“futebol-científico” da então União Soviética. De lá para cá, a dimensão dada a esta
oposição tornou-se singular para se entender o fenômeno futebolístico no país e sua
correlação com a cultura. Atentemos para o fato de que quando estamos diante de
campeonatos locais e nacionais, a discussão entre “arte” e “força”, torna-se secundá
ria e a ênfase no discurso da vitória recai sobre elementos tais como “união”, “con
junto” e “determinação”. Ocorre que a seleção brasileira tem o poder de se transfor
mar em metáfora da nação, na “pátria de chuteiras”, como muito bem alcunhou o
dramaturgo e escritor Nelson Rodrigues décadas atrás13. Aqui, principalmente em
Copas do Mundo, tendemos a valorizar o lado mais estético, alegre, criativo, e “ar
tístico” do futebol, como sendo características típicas da sociedade brasileira.
Assim, no dia 15 de setembro daquele ano, a matéria com o título “Irreverência
e habilidade na Granja. É Romário” apresenta, logo de início, o sugestivo texto: “o
mesmo jeito relaxado, de pouco empenho e até uma certa má vontade no aqueci
mento. Na hora da bola rolar, malícia, habilidade e competência”. Malícia e habili
dade se sobrepondo ao treino e à preparação física. Como a seleção não vinha apre
sentando um futebol considerado “arte” pela mídia – em várias reportagens anteri
ores comentava-se que estava faltando “alegria”, “picardia”, enfim “malandragem”
na seleção – o retorno de Romário tornava a seleção mais “brasileira”. Ou seja,
Romário aparece como o elemento capaz de nos fazer reconhecer no futebol da
seleção.
No primeiro treino para a partida decisiva, o noticiário ressalta o entrosamento
da dupla Romário-Bebeto, mas sempre enfatizando o lado “malandro” do primeiro.
Em outra matéria publicada no mesmo 15 de setembro, sob o título “Dez para a
dupla diabólica” temos o seguinte destaque: “Romário, com jeito moleque, disse
que nem sabia quantos gols tinha feito (marcou três...)”. Em um box com o título
“Romário, um craque até na arte de provocar risos” temos a seguinte declaração do
atleta: “antes eu era o problemático, o polêmico... salvador da pátria, vai ser mole
para mim” e ainda falando sobre o adversário: “não sei o nome de nenhum zaguei
ro, nem quero saber. Para mim, com líbero ou cinco laterais é a mesma coisa. O
único que me chateia é o goleiro, que tira os gols da gente”.
A ciência que Romário tem de seu papel assemelha-se ao início da saga clás
sica do herói que atende ao chamado e parte em busca da missão redentora (Campbell,
1995 e Brandão, 1993). Porém, Romário age com uma boa dose de picardia ao tratar
da missão como algo fácil e encarar os adversários com ar de deboche, nos fazendo
29
lembrar de Garrincha, “a alegria do povo”, o herói brasileiro cuja biografia
antagonizava com a de Pelé na década de 196014.
Veio a partida contra o Uruguai e Romário, autor dos dois gols da vitória por
2 a 0, “veste” a capa do “herói”, do “redentor”, do “salvador”, daquele que “ouviu o
chamado, partiu para a missão e saiu-se bem sucedido, dividindo o feito com seus
semelhantes” (Campbell, 1995).
No dia seguinte à partida a manchete da edição de esportes de O Globo es
tampava “O show de Romário” com o seguinte texto:
O futebol agradece a Romário. Os torcedores santificam Romário. Zagalo
aplaude Romário. Bebeto quase chora ao lado de Romário. O mundo se ren
de a Romário. Não é exagero... O pequeno atacante do Barcelona cumpriu
tudo o que prometera durante a semana. Fez os dois gols da vitória por 2 a 0
sobre o Uruguai (...) e deu autêntico show, ontem no Maracanã, para delírio
de mais de cem mil torcedores (...)Romário é craque. Romário é arte. Romário
é gol (...) O indisciplinado, rebelde, irreverente, o atrevido baixinho nascido
no Jacarezinho e criado na Vila da Penha provou que sua arte dentro do cam
po compensa seus eternos problemas e até a má vontade para treinar (O Glo
bo, 20/09/93).
A promessa tinha sido cumprida, o Brasil vencera o Uruguai com dois gols
de Romário e estava classificado para a Copa do Mundo de 1994. A narrativa enfatiza
a conquista com “show” e “arte”, atributos que redimem Romário das “indisciplinas”,
do “atrevimento” e da “má vontade para treinar”. Contribuindo para a construção
da narrativa mítica, o texto diz que “o mundo se rende a Romário”, ressaltando no
final tratar-se de um “atrevido baixinho nascido no Jacarezinho e criado na Vila da
Penha”. A ênfase na origem pobre é uma constante em quase todas as narrativas das
biografias de nossos heróis futebolísticos. Não que esta origem não corresponda à
realidade. Certamente ela é verdadeira. Estou chamando a atenção para a dimensão
dada a ela. E, neste sentido, a narrativa mítica em torno da biografia de Romário
assemelha-se a de quase todos outros heróis do nosso futebol.
Porém, a construção da biografia de Romário é também pontuada por passa
gens que “glamourizam” a malandragem, a irreverência, o deboche e o relaxamento
(não gostar de treinar). É como se estivéssemos diante da vitória construída somen
te com talento e arte, como se trabalho, concentração, determinação e esforço fos
sem elementos dispensáveis para o êxito. E é neste sentido que a biografia de Romário
antagoniza com a de Zico.
Durante a Copa do Mundo de 1994, a pressão sobre Romário vai ganhando
um novo contorno: o atleta deveria, além de ganhar a Copa, fazer a seleção jogar o
“verdadeiro futebol brasileiro”. Descontentes com o esquema tático utilizado pelotécnico da seleção, jornalistas e colunistas não poupavam críticas à forma de se apre
sentar da seleção. Romário passa a ser visto como o jogador capaz de resgatar a
“brasilidade” na seleção. Além disso, Romário, volta e meia, desafiava a comissão
técnica dando declarações de insatisfação com as apresentações da seleção. Ele pas
sou, assim, a ter voz e um espaço considerável na mídia15.
Uma semana antes da estréia contra a Rússia, o noticiário se voltava para
Romário dividindo-se em relatos de seu temperamento rebelde e de sua consciên
cia da missão que lhe era atribuída: ganhar a Copa16. A rebeldia é tratada de forma
positiva como, por exemplo, na matéria “A dura missão de Dunga: domar o
irreverente Romário” (O Globo, 16/06/94). Aqui, o texto destaca declarações de
Dunga de que Romário está amadurecido, mais consciente de seu papel na seleção.
Interessante notar que é justamente Dunga, o emblema do jogador limitado tecni
camente, mas que se “esforça” o tempo todo e cumpre à risca as determinações
táticas, quem tem autoridade para falar de Romário. O jogador que tinha sido mar
cado negativamente na Copa de 1990 – “Era Dunga”17 – como o exemplo do futebol
que o Brasil deveria execrar, surge como o atleta que tem a missão de “domar o
irreverente Romário”. Dunga está para a “ordem”, assim como Romário está para a
“desordem”. Ou seja, temos aqui de forma paradigmática a convivência da “ordem”
com a “desordem”. E mais ainda a evidência do freqüente processo de redenção que
o universo esportivo nos oferece18, já que Dunga teria a oportunidade de se redimir
da fama que lhe impuseram na Copa anterior.
Após a vitória na estréia contra a Rússia por 2 a 0, a manchete da seção de
esportes de O Globo dizia “Vila da Penha 2 x 0 Kremlin” com o seguinte texto: o
Kremlin se rendeu à Vila da Penha do baixinho invocado: a estréia da seleção, uma
maiúscula vitória por 2 a 0 sobre a Rússia, foi o jogo de Romário”. Mais uma vez, a
mídia recorre a elementos ligados à origem pobre.. A ciência da missão de ganhar a
Copa é enfatizada em “O gênio da área – Romário diz que apenas começou a jogar”
(O Globo 22/06/94) com a seguinte declaração: “o gol na estréia foi só o começo. Já
disse que esta Copa é minha”19.
A partir daí o que temos é uma sucessão de declarações de Romário dizendo
que “vai ganhar a Copa para o Brasil”,20 e manchetes e textos que enfatizam sobre
maneira a “brasilidade” de seu futebol Partida após partida, estas matérias vão se
repetindo e terminam por “construir” um personagem heróico, com os atributos
daquilo que “essencializamos” como sendo “tipicamente brasileiro”. Assim, em
“Romário, o nome do tetra verde e amarelo” (O Globo, 18/07/93) temos o seguinte:
O tetracampeonato tem nome, sobrenome e origem: Romário de Souza Fa
ria, de 28 anos, nascido no Jacarezinho e criado na Vila da Penha. Por isso
mesmo, o tetra não poderia ser mais brasileiro, mais verde e amarelo. A traje
tória de Romário é a cara do futebol do país. Dos campinhos de terra batida
31
de um subúrbio do Rio até o Maracanã, a Europa, os EUA... o mundo. Ver
Romário campeão é acreditar que o Brasil do jeito que a gente conhece pode
ser mais. Pode ser campeão mundial (...) A fala cheia de gírias, os dribles que
derrubam a lenda de que no futebol moderno não há lugar para a habilidade– dribles de uma petulância só admissível nos campinhos da Vila da Penha.
Romário é assim. Já disse que, para ele, qualquer jogo é uma pelada em seu
subúrbio. O que faz lembrar um atacante de pernas tortas, campeão do mun
do, que chamava todos os laterais de João (...).
Fecha-se, assim, um círculo iniciado com a convocação de Romário para a
partida contra o Uruguai pelas eliminatórias da Copa do Mundo. O “indisciplinado”
Romário, através do excepcional talento, venceu a “disciplina” – “os dribles derru
bando a lenda de que no futebol moderno não há lugar para a habilidade”. A origem
humilde somada à “fala cheia de gírias” conferem o caráter de brasilidade ao herói.
Na edição “midiatizada” evidencia-se ainda um discurso do futebol como metáfora
da nação bem como da junção do indivíduo com o coletivo: “ver Romário campeão
é acreditar que o Brasil do jeito que a gente conhece pode ser mais. Pode ser cam
peão mundial”. A vitória de Romário é a de todos nós e a referência à Garrincha ao
final do texto, contribui ainda mais para conferirmos características de “brasilidade”– bem ao estilo Macunaíma – do novo herói.
Na edição da biografia de Romário como o herói da conquista da Copa do
Mundo de 1994, os recursos acionados pela mídia construíram um personagem
singular na nossa cultura. Quando falamos de Romário, apesar de dividir mais opi
niões do que Zico,21estamos lidando com as “essencializações” que fazemos de nós
mesmos, como seres mais “irresponsáveis”, “irreverentes” e “indisciplinados”, com
tudo de bom e de ruim que estes atributos carregam. A biografia de Romário lida
com aspectos mais impregnados em nosso imaginário, não ficando restritos à sua
biografia. Os atributos ressaltados na sua biografia são os mesmos que destacamos
na representação que fazemos de nós diante de um estrangeiro22.
Tanto a narrativa da biografia de Zico quanto a de Romário, seja na imprensa
ou nos livros, contêm informações “verdadeiras”. Porém, trata-se, em ambos os
casos, de uma edição dos fatos e, neste sentido, certos aspectos são super
dimensionados enquanto outros são relegados a um plano secundário. A eficácia da
edição ancora-se, no entanto, nos discursos e ações dos próprios atletas em questão.
E como ambos são consumidores da mídia e enquanto sujeitos psicológicos incor
poram as “realidades” ali “construídas”, eles passam a agir e a fazer declarações
inseridas no contexto criado que, por sua vez, tem que estar relacionado a um con
texto existente na sociedade. Assim, as narrativas das trajetórias míticas em torno
das figuras de Zico e Romário falam de dois modelos antagônicos de heróis e nos
mostram que as construções de suas biografias fazem parte de uma relação dialética
32
e dinâmica entre as ações dos “objetos mitificados” – Zico e Romário – e o contexto
social – o Flamengo das décadas de setenta e oitenta e a seleção brasileira na Copa do
Mundo de 1994.
Ronaldo Helal
Professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro
Notas
1. Uma versão ampliada da análise da biografia do Zico encontra-se em “As
idealizações do sucesso no imaginário brasileiro”. In: Logos n° 10, Faculdade de
Comunicação Social, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, 1999.
Posteriormente foi publicada, com algumas modificações, em “As idealizações de
sucesso no imaginário futebolístico brasileiro: um estudo de caso”. In: Alabarces,
Pablo (org.) - Peligro de Gol: estudios sobre deporte y sociedad en America Latina - Buenos
Aires, CLACSO, 2000. E mais adiante em “As idealizações do sucesso no imaginário
brasileiro”. In: Helal, R.; Soares, A J. e Lovisolo, H. (orgs.) A invenção do país do
futebol: mídia, raça e idolatria. Rio de Janeiro: Mauad, 2001.
2. Isto pode ser comprovado nas matérias jornalísticas da época. Interessante notar
a reconstrução da memória da Copa de 1970 nos jornais de hoje.
3. O enaltecimento da mídia ao técnico Luis Felipe Scolari na conquista da Copa do
Mundo de 2002 é uma exceção nas narrativas das cinco Copas conquistadas pelo
Brasil
4. Algumas das observações aqui apresentadas foram extraídas também, com algumas
alterações, do artigo “Mídia, ídolos e heróis do futebol” publicado na revista
Comunicação, Movimento e Mídia na Educação Física, vol.2 , ano 2, CEFD/UFSM, 1999.
5. Sobre uma discussão a respeito da reprodução de narrativas da imprensa pela
academia ver Soares (1998) e Helal e Gordon (1998).
6. Esta observação está calcada em depoimentos tomados pelo autor de pessoas ligadas
ao universo do futebol.
7. Para uma análise sobre o modelo universal da figura do herói tendo como fonte
de análise o filme Herói por acidente de Stephen Frears, ver Helal in Rocha (1998).
8. Uma versão ampliada da análise da biografia de Romário encontra-se em “Idolatria
e malandragem: a cultura brasileira na biografia de Romário” trabalho apresentado
na 11ª COMPÓS, UFRJ, 2002 (Publicação em CD-ROM).
9. Sou grato aqui ao meu ex-bolsista de iniciação científica da Uerj, Gerardo Catunda
Martins Júnior, pela coleta do material impresso. A coleta foi feita sobre as matérias
publicadas na seção de esportes do jornal O Globo.
10. No sentido weberiano da expressão, reunindo os traços dominantes, as
características mais significativas de um sistema, uma “construção abstrata que o
pesquisador faz no processo de apreensão de um fenômeno social, a partir de sua
diversidade no real” (Soares, 1994). 11. Em entrevistas informais com alunos da Faculdade de Comunicação da Uerj
que o têm como ídolo, todos amenizavam esta “sinceridade” ou “arrogância” com
um “no fundo ele não é nada disso” ou “ele é muito simples e incompreendido”.
12. Mais uma vez, ver Da Matta(1979) e Soares (1994).
13. Apesar de que a metáfora vem perdendo força nas últimas décadas, como César
Gordon e eu mostramos em outras ocasiões. Ver por exemplo “A crise do futebol
brasileiro e a pós-modernidade: perspectivas para o século XXI”. In: Eco-Pós Vol. 5,
n. 1 – Publicação da Pós-Graduação em Comunicação e Cultura, Rio de Janeiro:
UFRJ, 2002; “The Crisis of Brazilian Football: perspectives for the twenty-first
century”. In: J. A. Mangan e COSTA, Lamartine (orgs.) Sport in Latin American Society:
past and present. Essex: Frank Cass Publishers, 2002; “Futebol - mitos e representações
do Brasil”. In: Villaça, Nízia e Goés, Fred (orgs.) Nas Fronteiras do Contemporâneo:
território, identidade, arte, moda, corpo e mídia. Rio de Janeiro: Mauad, 2001.
14. Não estou com isso dizendo que a biografia de Garrincha fez mais sucesso do
que a de Pelé. Apenas enfatizo a “glamourização” de uma biografia malandra em
contraponto a uma outra mais ordeira, mas não necessariamente “caxias”.
15. Interessante notar que a rebeldia mais ao estilo “Macunaíma”, hedonista, “não
gostar de treinar”, ser “preguiçoso”, vai dando lugar a uma rebeldia mais “politizada”,
“denunciadora”. Para uma discussão mais detalhada desta transformação da rebeldia
“Macunaíma” para uma “politizada”, ver Guedes (1995).
16. Ver por exemplo a matéria “Romário: sou um vencedor. Vou arrebentar nesta
Copa” (O Globo, 16/06/94)
17. Esta expressão foi alcunhada pelo técnico da seleção brasileira de 1990, Sebastião
Lazaroni, para exprimir o estilo de jogo que pretendia adotar na Copa do Mundo.
Com a derrota do Brasil para a Argentina, a mídia “decretou” em diversas reportagens
o fim da “Era Dunga”.
18. Ver Helal (2000).
19. Uma outra afirmação de Romário destacou-se no noticiário do dia 21 de junho
de 1994: “foi uma estréia na Copa. Mas encaro todos os jogos como se fossem uma
pelada” (O Globo, 21/06/94). Esta afirmação e o destaque dado a ela, lembrou, uma
vez mais, Garrincha na Copa de 1958 onde ele teria dito que chamava todos os
marcadores de “João”.
20. Ver por exemplo “Romário - Fico mais à vontade na hora de decidir” (O Globo,
13/07/94)
21. Percepções do autor baseadas no acompanhamento diário do noticiário esportivo
no país.
22. O mais curioso é que Romário contribui ainda mais para o antagonismo das
duas biografias ao declarar que “Zico nunca foi nada na seleção” (O Globo, 13/07/
94). Esta e outras declarações de Romário em relação à Zico, aparecem ao longo da
década de 1990, culminando com o corte do jogador da seleção em 1998. Mais
curioso ainda foi o fato de Romário, após a Copa de 1994, ter jogado no Flamengo
por quase 5 anos, clube que tem Zico como seu maior ídolo.
34
Referências bibliográficas
BRANDÃO, Junito de Souza. Mitologia Grega, vol. 3. Petrópolis: Vozes, 1993.
BUCAR NUNES, Marcus Vinícius. Zico: uma lição de vida. Brasília: Offset Editora Gráfica
e Jornalística, 1986.
CAMPBELL, Joseph. O herói de mil faces. São Paulo: Cultrix, 1995.
CAMPBELL, Joseph e MOYERS, Bill. O poder do mito. São Paulo: Palas Athena, 1990.
COELHO, Maria Claudia e HELAL, Ronaldo. “A indústria cultural e as biografias de estre
las: as histórias de Babe Ruth e Tina Turner”. In: Cadernos Pedagógicos e Culturais v.5, n. –.
Centro Educacional de Niterói, 1996.
DAMATTA, Roberto. Carnavais, malandros e heróis. Rio de Janeiro: Zahar, 1979.
____________. “O carnaval como um rito de passagem”. In: Ensaios de Antropologia Estrutu
ral. Petrópolis: Vozes, 1973.
ECO, Umberto. Apocalípticos e integrados. São Paulo: Perspectiva, 1979.
GORDON, Cesar e HELAL, Ronaldo. “The Crisis of Brazilian Football: perspectives for
the twenty-first century”. In: J.A. Mangan e Costa, Lamartine (orgs.) Sport in Latin American:
past and present. Londres: Frank Cass, 2002.
GUEDES, Simoni L. “O salvador da pátria: considerações em torno da imagem do jogador
Romário na Copa do Mundo de 1994”. In: Pesquisa de Campo n° 1, Núcleo de Sociologia do
Futebol/Universidade do Estado do Rio de Janeiro, 1995.
HELAL, Ronaldo. “As Idealizações do Sucesso no Imaginário Brasileiro”. In: Helal, R., So
ares, A J., Lovisolo, H. A invenção do país do futebol: mídia, raça e idolatria. Rio de Janeiro:
Mauad, 2001.
___________. “As Idealizações de Sucesso no Imaginário Futebolístico Brasileiro: um estu
do de caso”. In: Alabarces, Pablo (org.) - Peligro de gol: estudios sobre deporte y sociedade en America
Latina. Buenos Aires: CLACSO, 2000.
___________. “Campo dos sonhos: esporte e identidade cultural”. In: Comunicação,Movimento
e Mídia na Educação Física, vol.3, ano 3. CEFD / Universidade Federal de Santa Maria, 2000.
___________. “As Idealizações do Sucesso no Imaginário Brasileiro”. In: Logos n° 10, Facul
dade de Comunicação Social, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, 1999.
___________. “Mídia, Ídolos e Heróis do Futebol”. In: Revista de Comunicação, Movimento e
Mídia na Educação Física, vol.2, CEFD/UFSM, 1999.
__________. “Cultura e Idolatria: Ilusão, Consumo e Fantasia” In: Rocha, Everardo (org.)
Cultura e imaginário. Rio de Janeiro: Mauad, 1998.
___________. “Mídia, construção da derrota e o mito do herói”. In: Motus Corporis, vol. 5
n.2, Rio de Janeiro, UGF, 1998.
HELAL, Ronaldo e GORDON, Cesar. “A crise do futebol brasileiro: perspectivas para o
século XXI”. In: ECO Vol.5, n.1, Rio de Janeiro: Publicação da Pós Graduação em Comu
nicação e Cultura, UFRJ, 2002.
____________. “Futebol – mitos e representações do Brasil”. In: Villaça, Nízia e Góes, Fred.
(orgs.) Nas fronteiras do contemporâneo. Rio de Janeiro: Mauad, 2001.
____________. “Sociologia, história e romance na construção da identidade nacional atra
vés do futebol”. In: Estudos Históricos n. 23, Rio de Janeiro: FGV, 1999.
MORIN, Edgar. As estrelas de cinema. Lisboa: Horizonte, 1980ROCHA, Everardo. “As Invenções do Cotidiano: o descobrimento do Brasil e a conquista
do Tetra”. In: Pesquisa de Campo n° –, Núcleo de Sociologia do Futebol/UERJ, 1996.
SOARES, Antônio Jorge. Futebol, raça e nacionalidade: releitura da história oficial. Tese de Dou
torado defendida em novembro de 1998 no Programa de Pós-Graduação em Educação Fí
sica da Universidade Gama Filho. Inédito.
___________. Futebol, malandragem e identidade. Vitória: SPDC/UFESm 1994.
ZICO. Zico conta sua história. São Paulo: FTD, 1996.
Resumo
Apresentando resultados parciais do projeto “Meios de Comunicação, Idolatria e Cultura
Popular no Brasil”, apoiado pelo CNPq, o artigo se propõe a analisar duas biografias de
ídolos do futebol brasileiro: Zico e Romário. O artigo conclui que a biografia de Zico, ao
enfatizar o sucesso através do esforço e do trabalho, junta-se ao modelo de herói clássico.
Este modelo é antagônico ao padrão predominante na construção da idolatria nas narrativas
“oficiais” no Brasil. Aqui, temos freqüentemente um ideal “essencializado” de seres
“moleques” e “irreverentes”. Já a análise da biografia de Romário, tendo como base
principalmente o material jornalístico sobre sua trajetória na conquista da Copa do Mundo
de 1994, demonstra como os recursos acionados pela mídia dimensionam aspectos
relacionados à “irreverência” e à “malandragem”, construindo um personagem singular da
nossa cultura. As narrativas das trajetórias dos dois atletas falam de modelos antagônicos de
heróis cultuados em nossa cultura e nos mostram que as construções de suas biografia fazem
parte de uma relação dialética entre as ações dos “objetos mitificados” – Zico e Romário – e
o contexto social.
Palavras-chave
Esporte, mídia, idolatria.
Abstract
This article presents partial results of the Project “Media, Idolatry and Popular Culture in
Brazil”, granted by CNPq. It analyses two biographies of idols of Brazilian soccer: Zico and
Romário. The article concludes that Zico’s biography emphasizes success throughout
discipline and work, configuring the pattern of the classic hero. The opposite pattern
predominates in the construction of idolatry in the “official” narratives in Brazil. Here we
have very often an “essencialized” ideal of “irreverent” and “undisciplined” human beings.
However, the analysis of Romário’s biography, mostly based on the press coverage about his
performance during the victory of 1994 Soccer World Cup, shows that the media’s narrative
emphasizes qualities related to “irreverence” and “roguery”, constructing a singular character
of our culture. The narratives of the trajectory of both athletes concern about antagonist
hero patterns of Brazilian culture and show us that the “construction” of their biographies
is part of a dialectical relation between the acts of the “mythical objects” - Zico and Romário– and the social context.
Key-words
Sport, Media, Idolatry
Confira os gols oficiais . . https://docs.ufpr.br/~
Imagem ; Facbook Fábio Azevedo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário